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Tostão

Cópia não é original

No passado, havia mais atletas baladeiros, pouco profissionais, que treinavam e corriam menos

A história não conta toda a verdade. Falta o que está nas entrelinhas, na subjetividade, no que não foi dito. Isso é tão ou mais importante. Outras vezes, a história diz inverdades, de acordo com os desejos e as ideologias dos narradores. Não existe observador totalmente neutro. Em volta de uma verdade, há sempre uma mentira.

Muitas coisas ditas e repetidas sobre o futebol e sobre as pessoas, da época em que eu era atleta, não são verdadeiras. A ditadura foi terrível,mas Zagallo não convocou Dario porque o presidente Médici pediu ou ordenou. Dario merecia ser chamado.

Escuto, com frequência, que os jogadores do passado tinham amor à camisa, que o futebol era maravilhoso e que, hoje, é apenas um grande negócio. São meias verdades. "O perigo de uma meia verdade é você dizer exatamente a metade que é mentira" (Millôr Fernandes).

Não há dúvidas de que, antes, os jogadores, por terem mais chances de ficar um longo tempo em um clube, criavam mais vínculos afetivos. Isso é essencial para um profissional desenvolver seu talento. Por outro lado, havia mais atletas baladeiros, que treinavam pouco e que, por não terem ótimas condições físicas, corriam menos. O doping era mais frequente, pois não havia exames.

Como hoje, existiam comportamentos bem diferentes. Quando saí do Cruzeiro para o Vasco, fiquei abismado com tanto pagode e com tão poucos treinos. A concentração era pouso para alguns jogadores recuperarem o sono.

Havia mais Jobsons e Adrianos que hoje. No Cruzeiro, antes do Mineirão, tinha um jogador que, com frequência, desaparecia. Dias depois, voltava com cara de anjo. Outro, centroavante, só fazia gols se fugisse da concentração, na noite anterior ao jogo, para encontrar com sua amada, em um cabaré. Voltava inspirado.

As partidas eram menos tumultuadas, mas os lances isolados, individuais, de violência, eram mais graves que hoje. Pernas eram mais quebradas.

Havia mais craques em um grande time ou na seleção, mas havia também muitos pernas de pau. Os espaços maiores serviam para os craques mostrarem seus talentos e, para os medíocres, suas limitações. Ninguém enganava. Medíocre tinha jeito e cara de medíocre. Não fazia pose de craque.

A lembrança é diferente da memória. Não lembramos tudo que está na memória, nem todas as lembranças são exatas. Não adianta consultar o Google para confirmar. O Google apenas copia, não sei de quem. A cópia nunca é igual ao original.

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