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Juca Kfouri

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O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

Espírito olímpico

E, então, quando a lendária figura do ex-Beatle Paul McCartney apareceu na festa...

It was a beautiful party, bro, mas...

Mas é apenas a necessidade que temos de nos emocionar e imaginar um mundo melhor que permite nosso autoengano a cada quatro anos na abertura e, principalmente, no fechamento dos Jogos Olímpicos.

Até mesmo em Moscou, em 1980, todos nos comovemos com o ursinho Misha e sua lágrima, embora nada menos que 69 países, liderados pelos EUA, tenham boicotado aqueles Jogos por causa da invasão soviética no Afeganistão -troco dado em Los Angeles, pelos da órbita comunista, na edição seguinte.

Ali, o espírito olímpico já era uma quimera, não só pela competição política que se estabeleceu como fruto da Guerra Fria e pela prática disseminada da dopagem como, também, por causa da covardia inominável cometida contra os atletas de Israel em Munique-1972.

Para Bebeto de Freitas, o vitorioso técnico de vôlei e ex-presidente do Botafogo, até que acontecesse o atentado terrorista ainda havia algum sentimento de confraternização por meio do esporte.

Para o cineasta Ugo Giorgetti, nem isso, como mostra em seu recente, e excelente, documentário sobre a Olimpíada do México, em 1968, a última livre, segundo ele.

Porque a partir de Munique a paranoia da segurança, exacerbada pelo 11 de setembro de 2011, em Nova York, tomou conta de cada passo olímpico, a ponto de ontem, em Cardiff, os soldados britânicos e suas apalpadelas insolentes chegarem ao limite da inconveniência, mesmo depois de todas as praxes de raios-X e quejandos para a entrada no Millennium Stadium. Além de que o esporte como negócio ficou muito mais importante que esse negócio de esporte -e não é por outro motivo que os cartolas se perpetuam e enriquecem nos cargos.

Há até quem, como Carlos Nuzman, que após duas tentativas derrotadas de ser eleito para o Comitê Executivo do COI acaba jubilado pela idade, prática que tentou mudar também sem sucesso, vira membro honorário, como é estatutário, até morrer -ou se demitir, como João Havelange- e se vangloria.

Estamos cansados de saber disso, alguns de nós não se cansam em denunciar isso, mas...

Mas parece que todos voltamos a ser crianças inocentes e apaixonadas quando a bola começa a rolar, as piscinas borbulhar e as pistas incandescer. Esquecemos de tudo, nos encantamos em contar o feito de uma, a façanha de outro, sempre em busca de heróis e heroínas.

É humano e é até melhor que assim seja para que o amargor não prevaleça 24 horas por dia e o ceticismo não se transforme em desesperança e simples niilismo, mas...

Mas quando Paul McCartney apareceu na festa olímpica foi impossível não lembrar de John Lennon.

Imagine.

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