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Edson sonha montar um Santos para Pelé
Longe do clube e do país, ídolo cobra crédito por Meninos da Vila e revela intenção de criar um time
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JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ainda sob o abalo do fracasso de
ontem, o Santos deve receber
mais uma má notícia. Além de sua
torcida continuar "viúva de Pelé",
pelo menos na Libertadores, pode, no futuro, ter o maior ídolo de
sua história como concorrente.
É que Edson Arantes do Nascimento, 62, o Pelé, resolveu montar uma escolinha de futebol para
revelar novos valores e até já cogita transformá-la em clube.
"Vai ser minha aposentadoria",
afirmou Pelé à Folha, por telefone, horas antes da final de ontem.
Só que as revelações que ele espera encontrar e formar não irão
necessariamente para o Santos.
"Não teremos vínculo com time
algum. Os jogadores poderão ir
para qualquer equipe que se mostrar interessada ou, no futuro, até
podemos formar um novo clube."
E Pelé tem até um nome em
mente: Litoral Futebol Clube.
Como ele considera ter aberto
as portas para Diego, Robinho e
Alex no Santos -"briguei [com a
diretoria] por insistir que a solução era investir nas categorias de
base"-, diz que depois da Copa
de 2006 pretende se especializar
como descobridor de talentos.
Na verdade, o projeto evidencia
a distância que existe entre ídolo e
clube. A atual cúpula santista é de
um grupo adversário do de Pelé,
tanto que o ex-jogador, em um
momento crucial, permaneceu
no exterior. Disse que tentaria assistir ao jogo pela TV de um restaurante português em Newark
(EUA) ou, em último caso, ligar
para familiares no Brasil.
Chegou a arriscar um palpite:
Santos 2 a 0, com decisão nos pênaltis. O prognóstico parou aí.
Folha - Na primeira partida da final você estava em Londres, na segunda, em Nova York...
Pelé - Faz parte da minha vida.
Não tinha como adiar os compromissos nos Estados Unidos, só
vou poder voltar ao Brasil na segunda e mesmo assim por pouco
tempo. Gravo um comercial do
Café Pelé e depois já tem a Copa
da Paz [na Coréia, da qual Pelé é
um dos promotores].
Não sobra muito tempo, deixei
meus filhos em East Hampton, já
fui trabalhar, vivo viajando.
Quando dá, acompanho de perto,
mas nem sempre é possível.
O primeiro jogo vi em compacto, mas só depois. Quando não
posso ver, vou ligando para o Brasil e me informando do resultado.
Folha - Suas divergências com a
atual administração do Santos não
explicam sua ausência da final?
Pelé - Não, são apenas os compromissos profissionais.
E a própria campanha do Santos mostra que eu estava com a razão. Quando me desentendi com
a diretoria era porque ela investia
errado. Contrataram Carlos Germano, Valdo, Valdir, Rincón, Edmundo, só veteranos, quando o
certo era apostar na nova geração.
Se tivessem insistido em veteranos com mais de 30 anos, esses
novos Meninos da Vila não iriam
aparecer. Foi só mudarem o eixo
para as coisas darem certo.
Estou muito contente. Ajudei a
revelar Diego, Robinho e Alex, fico feliz em vê-los valorizados. É
uma vocação que eu tenho e que
pretendo levar adiante.
Folha - Como?
Pelé - Estou montando uma escolinha de futebol com o Manoel
Maria [ex-atacante que jogou
com Pelé na década de 70], quero
descobrir e formar novos jogadores em Santos e no Guarujá.
É um dom que eu tenho e que
deve ser usado.
Hoje ainda falta tempo para me
dedicar ao projeto. Vamos ter um
campo com as medidas do profissional, dois menores, uma estrutura para a molecada. A idéia do
projeto é o dez na bola, dez na escola. Não queremos formar apenas jogadores, mas cidadãos.
Folha - O projeto vai ter alguma
ligação com o Santos?
Pelé - Com time algum. O problema de você vincular uma escolinha com o Santos ou com qualquer outro clube é que de repente
muda a diretoria, mudam as diretrizes, a política... Você sabe como
é. Tem dirigente que prefere investir em categorias de base, tem
dirigente que sofre pressão e age
mais de maneira imediatista, investe em medalhões... Acho melhor termos autonomia.
Folha - E você vai negociar jogadores?
Pelé - Não necessariamente, vamos ver. A intenção é ajudar o futebol brasileiro, tentar manter
nossos craques no Brasil.
Os jogadores poderão ir para
qualquer equipe interessada, não
precisa ser para uma especificamente, ou podemos vir a formar
um novo clube. O que gostaria é
que ficassem no Brasil.
Folha - O projeto ou a escolinha já
tem algum nome? E se no futuro
decidir mesmo criar um time próprio ele levaria o Pelé no nome?
Pelé - Acho que não, a idéia não
é essa. Pensei em outros nomes,
acho que até agora o melhor foi
Litoral. Litoral Futebol Clube seria bom para um time, engloba toda a Baixada [Santista]. Mas eu
vou poder me dedicar mesmo ao
projeto depois da Copa [da Alemanha, em 2006]. Até lá tenho
muitos compromissos.
Folha - Você acha que suas antigas divergências com Ricardo Teixeira influenciaram no veto ao São
Paulo participar da Copa da Paz?
Pelé - Não, não. O problema foi
com o São Paulo, eles assinaram
um contrato, desistiram em cima
da hora e agora vão ter que pagar
multa [o valor da indenização pedida é de cerca de US$ 3 milhões].
Foi o São Paulo, não a CBF, que
assinou o contrato.
Folha - E sobre a seleção de Parreira, não esperava vê-la na final
da Copa das Confederações?
Pelé - A seleção brasileira tem de
ser mais valorizada. Não foi culpa
do [Carlos Alberto] Parreira, é
que não adianta você pegar um time, treinar apenas durante uma
semana e jogar.
A seleção tem de ir bem não só
em épocas de Copa, mas o Parreira, como qualquer outro treinador, precisa de tempo.
Folha - O que você achou da decisão da Copa das Confederações?
Pelé - Foi decepcionante. Primeiro porque todo mundo esperava ver uma revanche da final de
98 [entre Brasil e França], segundo por causa da morte do Foe
[Marc-Vivien, jogador de Camarões, na semifinal do torneio].
Foi uma tristeza que contagiou
todo mundo, uma cena chocante
mesmo.
Folha - E do Leão como técnico,
você gosta?
Pelé - Tem crédito. O trabalho
com a garotada é muito bom, você percebe que o grupo gosta dele.
O Santos ganhou o Brasileiro
[de 2002] e o sucesso não subiu à
cabeça do grupo, a campanha no
Brasileiro [de 2003] e na Libertadores é a prova do bom trabalho.
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