São Paulo, segunda-feira, 03 de setembro de 2007

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Nem elite cuida do coração do atleta, diz especialista

Nabil Ghorayeb afirma que, mesmo após morte de Serginho, exames não são feitos corretamente e empresários evitam até levar jogadores ao médico

MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os corações dos atletas estão desamparados, e a maior parte das recentes mortes no esporte poderia ter sido evitada com uma simples ida ao médico.
Nem mesmo a elite da mais rica e badalada modalidade do mundo tem se preocupado com os cuidados para evitar tragédias como a ocorrida na Espanha, na semana passada, com o jogador Antonio Puerta.
O diagnóstico alarmante é dado por um dos principais cardiologistas ligados ao esporte, que acompanha de perto, há mais de 20 anos, os corações dos principais atletas do país.
Nabil Ghorayeb, do Hospital do Coração, é responsável atualmente pelos exames de São Paulo e Palmeiras. Também comandou a equipe que testou todos os atletas da delegação do Brasil no Pan do Rio.
"Hoje o exame médico é obrigatório. O problema é como ele é feito. Os testes específicos não têm sido feitos de maneira obrigatória nem competente. Os atletas vão a qualquer lugar e são atendidos por profissionais que, por falta de conhecimento do esporte, não estão aptos a diagnosticar certos problemas", afirma Ghorayeb.
"Não me conformo com essas mortes. Várias delas poderiam ter sido evitadas com um bom diagnóstico ou com socorro adequado", completa.
Só na última semana ao menos sete atletas, amadores e profissionais, haviam morrido durante a prática esportiva.
O Brasil conheceu esse drama de perto em 2004, com a morte do zagueiro Serginho. Desde então, o desfibrilador tornou-se equipamento obrigatório de socorro. O número de pedidos de exames aumentou. E o medo de ter doença grave diagnosticada também.
"Muitos atletas simplesmente se recusam a fazer os testes. Existem também casos de empresários que não querem que seus clientes sejam examinados", conta Ghorayeb.
Caso emblemático aconteceu antes do Pan. A pivô Katia Regina dos Santos teve detectadas irregularidades no ritmo cardíaco e foi afastada da seleção de basquete. A jogadora sabia do problema desde 2004 e, mesmo sem autorização médica, atuava na Espanha.
Entre os clubes do futebol paulista, só o São Paulo fez acompanhamento do elenco ininterruptamente na última década, segundo Ghorayeb.
A ausência de exames específicos também já criou muitos casos de diagnósticos errados.
"O William, do Palmeiras, por exemplo, foi afastado dos gramados por cinco médicos. Quando o analisei, vi que poderia voltar", diz o cardiologista.
O cenário da elite brasileira dos esportes olímpicos é ainda mais preocupante. Exames cardíacos são luxo para uma legião de atletas que não têm nenhum tipo de acompanhamento médico. Mais da metade do elenco que foi ao Pan nunca havia pisado em um consultório.
"Muitas mulheres não haviam ido nem ao ginecologista. Cerca de 8% tinha verminose. Lombriga era problema recorrente", relembra Ghorayeb.
Só a pivô Katia foi afastada de suas atividades por problemas cardíacos. Mas 4% dos competidores apresentaram algum tipo de alteração nos exames.
Nas equipes de luta, a preocupação com o coração aparecia na dieta. Alguns atletas bebiam vinho todos os dias para prevenirem doenças. E comiam fartas porções de carne três vezes ao dia para ficarem fortes. "Minha impressão final é a de que quem ganha medalha é um herói", afirma Ghorayeb.


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