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FUTEBOL
Tempo dos jovens
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Janeiro é o mês dos garotos
entrarem em campo. Já começaram a Copa São Paulo de juniores e o Sul-Americano sub-20.
As quatro melhores seleções estarão classificadas para o Mundial,
em março, na Arábia Saudita.
Teremos ainda este mês o torneio sub-17 na Venezuela, que
servirá de classificação para o
Mundial na Finlândia. A seleção
sub-23, dirigida por Ricardo Gomes, disputará neste mês um torneio no Qatar. As seleções brasileiras de jovens não foram bem
nos últimos Mundiais. As equipes
sub-17 e sub-20 foram eliminadas
nas quartas-de-final, e a olímpica
perdeu para Camarões.
Frequentemente aparece na
Copa São Paulo de juniores uma
promessa que se tornará realidade. Porém a maioria dos jogadores que disputa o torneio não será
atleta de um grande clube, muito
menos um craque. Ficará no meio
do caminho, por falta de talento,
de oportunidades, de melhor
orientação ou porque não teve
preparo emocional para conviver
com a fama e o sucesso.
Muitos desses meninos que não
serão profissionais ficarão frustrados e/ou despreparados para
exercer outras atividades. Por isso, os clubes deveriam orientá-los
e prepará-los para fazerem outros
trabalhos. Somente os clubes que
fizerem isso e investirem nas categorias de base deveriam ter prioridade na assinatura do primeiro
contrato do atleta.
Mesmo os garotos que jogarão
em grandes clubes necessitam de
orientação para serem melhores
profissionais e terem consciência
crítica sobre a carreira.
Existem ainda graves denúncias de que somente os meninos
ligados a empresários são aproveitados nas categorias de base de
alguns clubes.
Os profissionais dessas entidades precisam ficar atentos e lutar
contra esta distorção. Esta é uma
responsabilidade ética.
A formação de um atleta começa na infância, nos campos de pelada, sem regras e professores. Antes de tudo, o garoto tem de adquirir intimidade com a bola. Ser
um artista antes de se tornar um
atleta. No início, com a bola de
meia. Depois, a de borracha. E,
por último, a de couro, já de chuteira atuando num time da várzea. A primeira chuteira, nunca
se esquece. É na infância que se
aprendem e se desenvolvem a habilidade e a criatividade.
Depois, nas categorias de base
dos clubes, o adolescente vai
aprender e aprimorar a técnica, a
tática, a importância do conjunto, conviver com a vitória e a derrota, descobrir a sua melhor posição em campo e outras coisas
chatas, mas necessárias.
Torna-se um atleta. Mas sem
perder a individualidade e a capacidade de imaginar e improvisar. A excessiva padronização inibe a criatividade.
Não basta treinar e repetir. Os
técnicos precisam ensinar e orientar. O bom professor é o que ensina ao aluno a aprender sozinho.
Alguns meninos, influenciados
pelos marmanjos, aprendem
também a fazer muitas faltas e a
dar pontapés sem serem expulsos,
a intimidar os árbitros e os auxiliares com provocações e ofensas,
a enervar os adversários com deboches e outras "delicadezas". Alguns técnicos adoram dizer que
futebol é para macho.
Por causa da falta de campos de
peladas, da proliferação de escolinhas pagas e outros motivos, está
havendo uma inversão na formação do atleta. Antes de possuir habilidade e criatividade, os meninos estão aprendendo a técnica, a
tática e as regras. Tudo padronizado. Na infância, os meninos
não têm um adequado desenvolvimento psicomotor para aprender certas coisas.
No lugar das escolinhas, os garotos deveriam ter, nas escolas
públicas, orientação, fazer exercícios físicos, brincar, desenvolver a
habilidade e a criatividade. Após
o curso primário, além de continuar estudando, os mais bem dotados seriam encaminhados para
os esportes de alto rendimento e
para as categorias de base dos
clubes. Sem empresários. Passei
por toda esta trajetória.
Apesar de tantas dificuldades, o
Brasil continua formando um
grande número de bons e excelentes jogadores. Isso acontece por
causa da tradição, o país é imenso, o esporte é barato (joga-se até
descalço e sem camisa) e os meninos adoram, sonham e lutam para se tornarem craques, já que a
maioria terá poucas oportunidades na vida.
Se o Brasil fosse um país mais
desenvolvido socialmente e a
maior parte dos meninos estudasse em excelentes escolas públicas e
tivesse, posteriormente, ótimas
chances de trabalho, o futebol
brasileiro teria o mesmo encanto?
Não sei.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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