São Paulo, terça-feira, 08 de setembro de 2009

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JOSÉ ROBERTO TORERO

A verdade sobre o Grito


Debaixo de uma das traves de palmeiras à beira do Ipiranga, dom Pedro 1º assiste a um show do futebol brasileiro


QUANDO FAZIA as pesquisas para meu primeiro livro ("O Chalaça"), um romance histórico que tem como protagonista o secretário particular do primeiro imperador do Brasil, deparei-me com um documento surpreendente: uma carta de dom Pedro 1º para sua amante Domitila de Castro Canto e Melo, a marquesa de Santos.
Tais papéis contavam uma nova versão para a independência do país.
Tratava-se de uma revelação tão retumbante que, confesso, tive receio das possíveis repercussões e a omiti.
Porém, passados 15 anos do livro e quase 200 desde o Dia do Grito, finalmente tomo um gole de coragem e trago a público esta importante página da história pátria: "Titília, minha querida, nestes dias aconteceram coisas mui divertidas que não posso deixar de te contar. Tudo começou quando voltávamos de Santos. Estávamos ao lado do riacho Ipiranga quando o Chalaça espreguiçou e disse: "Bem que podíamos dar uma parada e jogar uma partidinha de futebol".
Imediatamente aprovei a ideia e ordenei à comitiva que desmontasse dos burros. Por sorte havia dois pares de palmeiras que nos serviriam perfeitamente de traves. Porém, havia um problema. Não estávamos em 22, mas apenas em 13. Então mandei que o Chalaça fosse convidar nove homens entre os camponeses que estavam ali perto a nos observar. Como não se nega um convite do príncipe regente, logo tínhamos onze de cada lado. Um dos times, só com os portugueses da comitiva, ficou escalado assim: Joaquim; Manuel, Joaquim Manuel, Manuel Joaquim e Manu; Quim, Manuelzão e Quinzinho; Maneco, Quinzão e Jota Eme.
No outro ficamos o Chalaça, eu (de goleiro, é claro) e os nove brasileiros. Não lembro de todos, mas sei que havia um de pernas tortas, um de fartos bigodes, um que possuía um nome grego (talvez Sófocles), um branco alcunhado de Galinho e um negro chamado Nascimento.
Mal começou a peleja e vi que seria um passeio. Os brasileiros trocavam passes com tanta maestria que mais pareciam bailarinos. Penetrávamos na defesa adversária como se fôssemos faca e ela, manteiga. Eu não precisei fazer uma defesa sequer e fiquei encostado numa das palmeiras assistindo ao espetáculo.
Os nossos golos brotavam naturalmente, e o primeiro tempo terminou com o redondo placar de 10 a 0. Foi então que minha comitiva, irada por perder de forma tão vexaminosa, cercou-me e exigiu que eu e o Chalaça deixássemos o time dos brasileiros e passássemos à equipa dos lusitanos. "Teu dever é defender Portugal", diziam eles.
Pensei em como seria terrível enfrentar aquela equipa e não tive dúvidas, ergui a bola e gritei: "Pelo meu sangue, pela minha honra, pelo meu Deus e pelo meu time, juro promover a liberdade do Brasil! Independência ou morte!'
O jogo continuou e terminamos ganhando por 23 a 1 (o Chalaça fez um golo contra).
Pois bem, minha Titília, esta é a verdadeira história da Independência do Brasil. Mas, pensando no futuro, creio que vou inventar uma versão menos prosaica, com soldados, espadas e cavalos brancos. Um beijo do teu imperador e goleiro, Pedro."

torero@uol.com.br


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