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Omitir documentos do processo, validar só parte de confissão e dar entrevista sobre o caso são condutas irregulares
Para estudiosos, Zveiter atropela o direito
LUÍS FERRARI
RODRIGO MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
A conduta do desembargador e
presidente do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), Luiz
Zveiter, no escândalo de manipulação de resultados no Brasileiro
atropelou princípios gerais do direito. O diagnóstico é de especialistas ouvidos pela Folha.
Algumas das medidas que tomou foram possíveis pelo Código
Brasileiro de Justiça Desportiva
(CBJD), que é mais informal e por
isso lhe dá mais poder. A legislação foi elaborada com a ajuda do
próprio Zveiter.
Presidente do tribunal, ele integra a comissão de 11 membros
Ministério do Esporte (ME) que
fez o código. Essa lei foi ratificada
quase sem mudanças pelo Conselho Nacional do Esporte (CNE),
segundo José Cácio, advogado do
ME e membro da comissão.
"O fato dele legislar e julgar traz
o inconsciente de que ele é o dono
da verdade no tribunal", afirma
Gustavo de Oliveira, vice-presidente do Instituto Brasileiro de
Direito Desportivo.
Na anulação dos 11 jogos de
Edilson Pereira de Carvalho, os
clubes descontentes reclamaram
do cerceamento ao direito de defesa. Isso porque Zveiter não lhes
mostrou todo o processo.
"Não há dúvida de que os princípios processuais valem também
em processos administrativos
[como os da Justiça Desportiva],
afinal, são regras do processo civilizado", explica Antônio Carlos
Marcato, professor de direito processual civil da USP.
Outra queixa dos clubes é o fato
de Zveiter ter considerado a confissão de Carvalho para anular as
partidas e não ter levado em conta
que o juiz também relatou que
não conseguiu alterar o jogo Figueirense x Juventude.
"A confissão é indivisível. Se for
levada em conta, precisa ser aproveitada na íntegra", diz Marcato.
São criticadas ainda as entrevistas dadas pelo presidente do STJD
antes do julgamento.
José Rogério Cruz e Tucci, também professor de direito processual civil na USP, explica que as
leis orgânicas da magistratura e
do Ministério Público e Estatuto
de Ética da OAB impedem os técnicos envolvidos em um processo
de comentarem uma ação publicamente antes de seu encerramento. "Tenho cuidado ao dar
exemplos nas aulas para não
identificar casos em andamento."
O fato de o presidente do STJD
ter tomado a frente na apuração
de fatos-como quando esteve na
Polícia Federal para se inteirar das
investigações- atenta contra sua
imparcialidade. Segundo os princípios processuais da inércia e do
dispositivo, o juiz só pode agir se
for provocado por uma das partes
do processo. São as partes que devem, na maioria dos casos, produzir as provas.
"O poder instrutório [capacidade de montar o processo] do juiz é
muito limitado no direito brasileiro. Como receptor e avaliador das
provas, ao produzi-las, ele perde
isenção. Há exceções, como
quando uma parte é incapaz, por
exemplo", ensina Marcato.
Como o pleno do STJD confirmou a decisão de Zveiter, até os
clubes que apresentaram recursos
acham difícil que as anulações sejam revertidas na esfera desportiva. Essa barreira pode se tornar
mais complicada de transpor no
futuro, já que Zveiter também
atua na reforma do CBJD atual.
Na comissão do Ministério, sua
influência nos procedimentos
processuais, que regulam sua
atuação, são decisivas. "Paulo
[Schmitt, procurador-geral do
STJD], Valed Perry [advogado da
CBF], Zveiter e eu damos mais
opinião no processual", diz Marcilio Krieger, membro do grupo.
No esboço do novo CBJD já há
duas mudanças que dão mais poder para o presidente do tribunal:
só ele poderá analisar se recursos
podem ser admitidos, por exemplo. "O Judiciário não entra no
mérito das decisões da Justiça
Desportiva. Mas, se houver falhas
no devido processo legal, elas podem ser anuladas", ressalta Tucci.
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