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TOSTÃO
Desformar o futebol
O futebol é a morada dos chavões. Mais difícil que derrubá-los é ver os grandes de São Paulo jogarem bem
EXISTEM CHAVÕES no futebol
que nunca foram verdades,
ou que deixaram de ser com o
tempo, e que ainda são repetidos
pelos mais velhos e pelos mais novos. Se você discordar, olham com
estranheza.
Há muito tempo ouço que os africanos jogam um futebol moleque.
Ao ver as últimas e a atual Copa da
África, que tem bom nível técnico e
alguns grandes jogadores, fica claro
que o futebol descontraído não existe há tempos. Hoje, Camarões e Egito fazem a final.
Com a importação de tantos treinadores europeus e a saída de grande número de jovens para a Europa,
todas as seleções da África possuem
hoje as características das seleções
européias, e não as dos melhores times da Europa. Estes, por terem
os melhores jogadores do mundo,
jogam de uma maneira diferente
e ousada.
As seleções da África atuam com
excessivo rigor tático, muita marcação e pouquíssima improvisação. Os
atletas africanos são ainda mais fortes e mais altos que os europeus. Como no Brasil, deve haver na África,
nas categorias de base, uma escolha
de atletas mais altos e fortes para exportação.
Outro chavão do futebol, que serve de desculpa para as más atuações,
é a falta de tempo para adquirir o famoso entrosamento. É evidente que
o tempo ajuda, embora às vezes
atrapalhe, pois mostra as deficiências.
Para definir a maneira de jogar e o
correto posicionamento dos jogadores -isso é básico para formar um
bom conjunto-, bastam boas e poucas conversas e treinos. Os detalhes
vão aparecer com o tempo.
Já dá para ver que o novo e modesto time do Corinthians apresenta
uma boa organização tática. Difícil é
ensinar Acosta a se orientar no tempo e no espaço, Lulinha a chutar a
gol e outros atletas a jogar um bom
futebol. Talvez nenhum tempo seja
suficiente.
Muitas grandes equipes surgiram
sem avisar e com poucos treinos.
Quinze dias antes da Copa do
Mundo de 1974, na Alemanha, os
holandeses resolveram inovar e surpreenderam e encantaram o mundo. O Santos, de Robinho e Diego,
apareceu de repente, sem nenhum
planejamento. A seleção brasileira
de 2002 só foi escalada com Gilberto
Silva, Kleberson, além de Ronaldo e
Rivaldo, que estavam contundidos,
próximo à Copa.
Há inúmeros exemplos.
A Irlanda não é um time chato e
que não deixa o adversário jogar, como falaram antes e durante a partida contra o Brasil. Esse é também
um antigo chavão. Como a Irlanda
recuava demais e iniciava a marcação na entrada da área, os nove jogadores do Brasil, menos Luis Fabiano, que ficava entre os defensores,
tinham toda a liberdade para dominar a bola e dar o passe para o lado.
Ninguém era pressionado.
Assim é fácil jogar.
Difícil é enfrentar os uruguaios, os
paraguaios em Assunção (como fez
o Cruzeiro) e as equipes pequenas
de São Paulo, que não deixam o adversário nem respirar.
O belíssimo gol de Robinho, dentro da área, em jogada de contra-ataque e com a defesa da Irlanda adiantada, não teve nada a ver com o que
aconteceu durante a partida. Foi um
lance isolado.
Só os craques conseguem transgredir e desformar o futebol.
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