São Paulo, domingo, 11 de novembro de 2007

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Discreto, Miranda vira o 1º da classe

Sem agente nem holofote, atleta do São Paulo com mais jogos no ano depois de Rogério é o principal alicerce da defesa

Caçula de 12 filhos joga na zaga em homenagem ao irmão mais velho, morto em acidente, e quase deixou a carreira após perder o pai


Fernando Santos/Folha Imagem
O zagueiro Miranda, jogador de linha que mais atuou pelo São Paulo nesta temporada, em treino da equipe no CT da Barra Funda

JULYANA TRAVAGLIA
MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando Breno marcou contra a própria meta o segundo gol do Juventude, em um jogo que não mudava em nada a vida do São Paulo, Miranda ficou mais abatido que os demais.
"Que golaço, hein, juvenil?!", exclamou depois, em tom de brincadeira, mas sem perder a autoridade que já tem no clube.
Afinal, pela primeira vez em um jogo, sua defesa sofria dois gols no Nacional que já é seu. E ninguém zelou mais por esses números que Miranda. Depois do técnico, é quem melhor pode explicar a defesa que levou apenas 15 gols em 35 jogos.
"Acho que foi a concorrência que deixou a defesa tão boa. Ninguém podia dar bobeira senão perderia a vaga", afirma.
Jogador de linha que mais atuou no ano (62) e homem de confiança de Muricy Ramalho, João Miranda de Souza Filho não é assediado por Real Madrid e Bayern (como o novato Breno) nem foi presença certa na seleção de Dunga (como Alex Silva, hoje lesionado).
No entanto, é praticamente um ídolo da comissão técnica. "Ele é sempre o primeiro a chegar e o último a sair. É extremamente profissional", diz o auxiliar técnico, Milton Cruz, um dos principais olheiros do clube, dando pistas do perfil de atleta que o clube procura. "Ele é a cara do São Paulo: bom jogador, casado, bom caráter."
O superintendente Marco Aurélio Cunha concorda."Parece veterano, nunca deu trabalho. É o primeiro da classe."
Com pouco mais de um ano no clube, Miranda alcançou dentro do São Paulo um status de exemplo profissional que só perde para o goleiro Rogério.
"Quando ele sente alguma dor, chega antes no CT e faz reforço muscular. Por isso não se machuca", afirma Milton Cruz.
Miranda, 23, parece mais experiente do que é. Além disso, é caso raro de jovem sem agente: 60% dos seus direitos são do São Paulo, e 40% são repartidos entre o atleta e o Sochaux.
Diz que já teve dois agentes: um que tentou lhe cobrar depois que o contrato entre eles já havia expirado, e outro, francês, que pouco ajudou.
"Meu empresário é o meu futebol. Só tenho um advogado que me ajuda com os contratos", diz ele, que renovou até 2011 com o São Paulo.
A escolha da posição no futebol e o amadurecimento vieram cedo. Caçula de 12 irmãos, optou pela defesa em uma homenagem ao irmão Vicente, o Piu, morto quando Miranda tinha 6 anos. "Na minha cidade [Paranavaí, no PR], até hoje dizem que ele era melhor que eu."
Vicente deixou o futebol para ajudar a sustentar a família. Trabalhador da companhia de luz local, perdeu a vida em um acidente elétrico que o carbonizou. "Acho que quis continuar o caminho que seria dele, por isso virei zagueiro", diz Miranda.
Cresceu nas divisões de base do Coritiba e atuou no clube em 2005. Aos 19, casado com Jaqueline, já grávida do menino João Victor, recebeu proposta do Sochaux -e quase parou.
Na mesma época, perdeu o pai, João Miranda, o que fez sua mãe, Maria, 69, lhe pedir que não fosse para a França.
"Cheguei a pensar em abandonar o futebol, até porque não sabia se ia vingar. Estava fragilizado", recorda. Continuou, e um ano e meio depois, jogando pouco no time, decidiu voltar.
Hoje, bicampeão e valorizado no São Paulo, mantém a mesma discrição ao não prometer virar ídolo da torcida como já é para a comissão técnica. "Futebol é dinâmico, é difícil ficar três anos no mesmo lugar."


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