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FUTEBOL
De volta à era do rádio
JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA
Hertziano leitor, ondulada
leitora, a confusão em torno
dos direitos de transmissão dos
jogos do Campeonato Brasileiro
da Série B tem obrigado os torcedores de poltrona de certos times
a entrar no túnel do tempo. Para
eles, a televisão ainda não foi inventada. Para eles, ainda estamos
na era do rádio.
E estes torcedores estão bem
atrasados, porque a tevê brasileira entrou no ar pela primeira vez
no dia 18 de setembro de 1950.
Apenas cinco ricaços possuíam
aparelhos então, mas o empresário Assis Chateaubriand (dono da
TV Tupi) tratou de instalar terminais em lugares movimentados
da cidade, como a praça da República e a rua Sete de Abril.
Foi assim, em pé e na rua, que
muitos assistiram às primeiras
atrações, como o programa humorístico "A Praça da Alegria",
ou as novelas "Helena" e "Sua Vida me Pertence". Naqueles tempos, a ligação entre ela e o futebol
era inexistente.
Na maioria das vezes, quem
queria acompanhar o andamento de uma partida só tinha uma
saída: ligar o rádio. Familiares e
amigos se reuniam ao pé do aparelho e participavam de uma espécie de ritual no qual as emoções
entravam pelo ouvido e eram filtradas pela imaginação. Experiência semelhante à de contar e
ouvir histórias que, aliás, fazia
parte da realidade da maioria
das pessoas.
Cada jogo era diferente na cabeça de cada um. Cada ouvinte
interpretava o que ouvia de um
modo particular. Uma falta poderia ser discutida assim por eles:
- Acho que foi uma entrada
desleal!
- Não, a voz do narrador não
estava tão embargada assim.
- Escute a torcida! Até agora
eles estão protestando!
- Deve ser o chiado da transmissão.
Não havia, como hoje, a autoridade da imagem, a auto-suficiência do replay e a prepotência do
tira-teima, elementos da tecnologia que não dão liberdade para
devaneios e suposições. O que é, é.
Ponto final.
Quando comecei a gostar de futebol, a tevê ainda era em preto-e-branco. E havia poucas transmissões. De vez em quando, um jogo
da seleção brasileira ou uma final
de campeonato, mas era só. Três
ou quatro partidas num mesmo
dia como se vê hoje, nem pensar.
Portanto a única saída era recorrer ao rádio. Lembro que os
cronistas se esforçavam por falar
de uma maneira um tanto elegante. Sem querer, as pessoas até
aprendiam algumas palavras diferentes, como "lide", "cordéis",
"porfia" e "estapafúrdio". Outras
eram até poéticas, como no caso
do célebre: "Fecham-se as cortinas e termina o espetáculo!", de
Fiori Gigliotti.
Palmeirenses, botafoguenses,
lusos, americanos, londrinenses,
remistas e tantos outros têm agora a possibilidade de voltar à era
do rádio. Para eles, não existe a
crueza definitiva da imagem,
mas a imprecisão da oralidade,
que nos obriga a preencher certos
vazios com a imaginação.
Em certos casos, pode ser uma
vantagem.
Apelidos
O leitor Edson Ribeiro, de Itu,
envia dois causos interessantes
de apelidos curiosos. O primeiro, de um goleiro do time de
uma fábrica local, tão ruim que
seus carinhosos companheiros
lhe deram o apelido de "Garras
de Quiabo". O segundo, do
mesmo time, pertencia a um
zagueiro de odor tão desagradável que, para não ser chamado de Urubu, foi alcunhado de
"Beija-Flor de Carniça".
Obrigado, Jesus!
Murilo Antonio Simões manda
uma singela sugestão: Do mesmo jeito que alguns jogadores,
depois de um gol, levantam a
camisa mostrando frases do tipo "Obrigado, Jesus", deveriam
mostrar outra camiseta quando
o gol não saísse. E essa outra
poderia ter a inscrição: "Pô, Jesus, assim não dá".
E-mail torero@uol.com.br
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