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FUTEBOL
Tudo como era antes
JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA
O Santos tem um belo esquadrão? Tem. Robinho e
Diego são craques? São. Leão é
um técnico competente? É.
Esses fatores deveriam ser suficientes para que os torcedores ficassem tranquilos quanto ao desfecho do campeonato no próximo
domingo. Mas não são.
O torcedor não é um ser que se
contenta com tão pouco. Para se
tranquilizar, ele precisa mais do
que postulados cartesianos, certezas racionais e raciocínios lógicos.
Ele precisa recorrer à magia, ao
sobrenatural e à superstição.
Eu mesmo tomei uma decisão
um tanto mística a respeito do jogo de domingo. Vou repetir, com
minúcia de detalhes, as mesmas
coisas que fiz naquele distante 3
de dezembro de 1984, quando o
Santos derrotou o Corinthians e
conquistou seu último título de
expressão (sem, é claro, menosprezar o Torneio Rio-SP, de 1997,
e a Conmebol, de 1998).
Lembro que vi o jogo em Santos,
pela TV, com um grupo de amigos: Juba, Nereu, Bilau, Milica,
Dedeco, Marlene e Pizza. Já fiz
contato com todos, e eles concordaram com a minha idéia. Veremos o jogo juntos e faremos as
mesmas coisas que fizemos há 18
anos atrás.
Felizmente guardei, sem lavar,
a camisa do clube, a calça, as
meias e o tênis com que fui ao estádio. Diante do tênis e das meias
não espero problemas, mas admito que ficarei um pouco esquisito
dentro daquela camisa e daquela
calça. É que o jogo foi há 15 kg
atrás. Minha barriguinha ficará
de fora e a calça apertada poderá
gangrenar determinadas regiões.
Mas tudo bem, a vida é mesmo
feita de pequenos constrangimentos e qualquer sacrifício é válido
pelo Santos.
Pior será para os outros.
O pobre Juba tinha aparado o
cabelo naquele domingo. Como
está careca, terá que cortar as sobrancelhas. Os cabelos se foram, a
fé continua. Nereu, hoje diretor
de multinacional que ganha meu
salário num dia, vai trabalhar de
garçom no bar Rabás.
Bilau, que virou investigador de
polícia, passará a madrugada fumando uma erva ilegal, tocando
violão e cantando "Terra!, Terra!,
por mais distante, o errante navegante, quem jamais, te esqueceria...".
Milica era de um grupo de esquerda e passou a madrugada toda panfletando numa porta de
fábrica. Virá toda de amarelo e
com uma enorme faixa onde está
escrito: "Abaixo a ditadura! Diretas-Já!".
Dedeco, Marlene e Pizza também irão. Dedeco tinha se casado
na véspera com a Marlene. Passaram a lua-de-mel num hotel da
cidade e, no dia seguinte, foram
ver a partida em minha casa. Separaram-se três anos depois porque Marlene se apaixonou por
Pizza, melhor amigo de Dedeco.
Pois ontem Dedeco ligou para
Marlene, explicou a situação e
propôs uma segunda lua-de-mel.
Por sorte, Pizza, que é ainda mais
fanático do que o Dedeco, entendeu o problema e topou a parada.
Só Marlene é que está meio confusa e ainda não disse que sim nem
que não.
De todo modo, domingo estaremos juntos mais uma vez. As esperanças, as roupas e as bandeiras serão as mesmas. Seremos um
bando de quarentões revivendo
um dia perdido no passado, um
tempo em que éramos jovens, magros, cheios de entusiasmo e cabelos. Será um sacrifício, mas, como
disse Fernando Pessoa ao voltar
de um jogo do seu Benfica: "Tudo
vale a pena quando a taça não é
pequena".
Santos americanos
Os leitores Lúcio Nunes e
Sylvio Novelli enviaram uma
seleção de americanos que
atuaram pelo Santos: Cejas
(Argentina); Fricsson George
(Equador), Ramos Delgado
(Argentina), Hugo De León
(Uruguai) e Oberdan (Uruguai); Rincón (Colômbia),
César Pereyra (Uruguai) e
Usuriaga (Colômbia); Carlos
Miráglia (Uruguai), Baéz (Paraguai) e Arturo Saens (Uruguai). No banco: Rodolfo Rodrigues (Uruguai), Gálvan
(Argentina), Aristizábal (Colômbia) e Armstrong (EUA).
Convite
A quem interessar possa, lançarei amanhã, em Santos, no
Cinearte Posto 4, a partir das
18h, o livro "Uma história de
futebol", romance infanto-juvenil (e, de quebra, para
adultos) inspirado no curta-metragem do mesmo nome,
que concorreu ao Oscar em
2001 e foi co-roteirizado por
este que vos escreve.
E-mail torero@uol.com.br
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