São Paulo, quarta-feira, 15 de maio de 2002

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FUTEBOL

Pressionado pela torcida e considerado deficiente na marcação por Scolari, ala-direito faz protesto e exige respeito

Criticado, Cafu reage contra o "massacre"

DOS ENVIADOS A BARCELONA

Recordista de jogos da história da seleção, segundo números da CBF, e prestes a disputar sua terceira Copa do Mundo, o lateral-direito Cafu, 31, cansou de ouvir críticas sobre suas atuações com a camisa verde-amarela.
Ontem, após treino matinal da equipe em Barcelona, o jogador da Roma, pivô da mais nova crise de identidade da seleção -a adoção do sistema 3-5-2-, desabafou, exigiu respeito e mostrou que não admitirá ser um cordeiro na "família" de Luiz Felipe Scolari, a quem mandou recados.
A chuva de reclamações, segundo Cafu vindas unicamente do Brasil, principalmente sobre seu modo de marcar e de cruzar, foi classificada por ele como um "massacre" e rebatida de forma surpreendentemente dura para um atleta de comportamento habitualmente dócil e resignado.
"A diferença na Europa é que, se eu errar um cruzamento, eu errei um cruzamento. No Brasil, se eu errar um cruzamento, é porque não sei cruzar. Jogo na seleção há 12 anos e acho que tinha de ser mais respeitado, é só isso", afirmou o lateral, que pode ser o primeiro jogador brasileiro a disputar três finais de Copa.
Cafu foi irônico ao comentar as declarações de Scolari de que o esquema 3-5-2 só foi introduzido na seleção por causa dele. "Não sei se é por causa disso. Mas, se for, é uma questão de muito orgulho para mim mudarem todo um esquema por minha causa."
Segundo o treinador da seleção nacional, na Roma Cafu atua muito avançado, quase como um ponta-direita, e não volta para a defesa a tempo de proteger a zaga em contra-ataques. Daí, alega Scolari, a necessidade de um zagueiro a mais no time brasileiro.
Mas o lateral-direito afirma que não é bem assim. Para Cafu, basta o técnico solicitar uma mudança de posicionamento e ele o fará, sem reclamações e sem dificuldades de adaptação.
"Nesses 12 anos de seleção, joguei quase todo o tempo assim [na lateral, mas com funções defensivas]. Não tenho problemas em me adaptar àquilo que o treinador pede", declarou Cafu, que aproveitou para alfinetar Scolari e os críticos que afirmam que ele não sabe defender bem.
"Agora nem marcar eu sei mais. Só queria saber de onde e por que isso nasceu", reclamou o jogador, alvo constante de chacotas de torcedores e humoristas sobre suas supostas deficiências.
Outra crítica recorrente diz respeito às falhas de Cafu em cruzamentos, mas ela não passa, entretanto, de uma falácia.
Levantamento recente feito pela Folha mostrou que o jogador é um dos melhores nesse fundamento em toda a Europa. Na Copa dos Campeões, principal torneio de clubes do mundo, ele tem um aproveitamento nos cruzamentos superior ao do português Luis Figo e igual ao do inglês David Beckham, duas estrelas que se notabilizam, entre outras coisas, pela precisão ao servir os companheiros em bolas alçadas .
Mais experiente jogador da atual seleção brasileira, Cafu, que contra Portugal completou 108 jogos com a camisa do time nacional, segundo números da CBF, viveu um dos piores momentos de sua carreira também às vésperas de uma Copa do Mundo.
No último jogo no Brasil da preparação para o Mundial de 98, um amistoso contra a Argentina no Maracanã, ouviu o coro da multidão: "Cafu, vai tomar no c...".
Ainda hoje considerado por alguns um ""vilão nacional", demonstra enorme mágoa, mas diz que tem a consciência tranquila.
"Se eu me incomodasse com todo esse massacre, não estaria há tanto tempo na seleção. Sinto-me ótimo, é mérito do meu trabalho. Não é fácil se manter por 12 anos num time desse. Sempre fui um cara tranquilo, o sorriso faz parte de mim", declarou Cafu, justificando o contraste entre as declarações e os dentes escancarados, uma marca registrada.

Capitão
Cafu ainda deixou claro que se considera o capitão de direito da seleção -o de fato, escolhido por Scolari, será o volante Emerson, seu companheiro na Roma.
Como se o treinador ainda não tivesse anunciado sua decisão, Cafu afirmou: "O técnico é quem decide. Se ele me escolher, será um orgulho muito grande".
E completou: "Aqui na Europa normalmente o mais velho do clube [o jogador que tem mais tempo defendendo o clube] é o capitão". O mais velho da seleção é Cafu. (FÁBIO VICTOR, JOSÉ ALBERTO BOMBIG E SÉRGIO RANGEL)



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