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MAC MARGOLIS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Entre o Cristo e o Congo
Ninguém protestaria
se chamassem o Rio
de Paris tropical, como rezava a moda no
início do século passado
E NÃO É QUE , apesar de
todo o esquema de
segurança, o Pan já
sofreu sua primeira baixa?
Antes mesmo do primeiro
apito, um integrante do comitê olímpico americano
foi vítima do seu próprio
petardo. A despedida do
engraçadinho foi comemorada por um coro de rara
unanimidade nacional: "O
Congo não é aqui!" Placar:
justiça 1, preconceito, 0.
Ou será? Por mais que as
boas maneiras relutem, o
preconceito e a prepotência acabam sempre escapulindo. Às vezes, mesmo em
forma de elogio. Assim, ao
rechaçar um deboche, a cólera nacional lançou mão
de outro. Como disse uma
colega, ninguém protestaria se chamassem o Rio de
Paris tropical, como rezava
a moda no início do século
passado. Mas Congo? Essa
não! O Brasil não merece.
Está certo. Rio não é
mesmo Brazzaville, como
também não há dúvida de
que a piada era mal intencionada. Mas por que tanto
alarde -foto e chamada na
capa do jornal "O Globo",
bombardeio de cartas, enquete pela internet- com a
opinião alheia? Certo, ninguém gosta da patada de
estranhos. Mas não é toda
crítica que consegue provocar indigestão coletiva.
Qual órgão vital brasileiro
o gringo do Pan atingiu?
Tamanha indignação parece trair uma insegurança
visceral. Vamos chamá-lo
do nervo congolês, a parte
mais delicada da alma nacional que, ao tocá-la, irradia dúvidas existenciais.
Ao que parece, o Brasil
ora se ufana das suas raízes
africanas, ora se horroriza.
É o mesmo país que fica
embevecido com um elogio
estrangeiro (do primeiro
mundo, é bom dizer), indignado com a sua desaprovação e desolado com a
indiferença. Se algum fato
da vida brasileira "deu" ou
não no "New York Times"
continua sendo um evento
nacional. O país inteiro vibrou com a eleição do
maior ícone carioca, o Cristo Redentor, ao rol das novas sete maravilhas do
mundo. Ai de quem teima
em lembrar que o Rio também é a cidade do caveirão.
No Rio, a síndrome não é
nova. Os governos estaduais da dupla Anthony
Garotinho e Rosinha Matheus jamais se entenderam com o do prefeito Cesar Maia. Bastou uma matéria do contundente "The
Independent" sobre a violência carioca para que as
duas esferas entrassem em
santa harmonia para denunciar o libelo forasteiro.
"Conheço várias pessoas
que foram assaltadas em
Paris", o secretário estadual de segurança me devolveu numa entrevista à
época. Não se assistia a tamanho zelo desde que os
guardiões do Estado se elevaram contra outra ameaça ao bom nome nacional
-Os Simpsons, desenho
animado que ousou gozar
da cidade maravilhosa. Talvez o Congo não fique mesmo tão longe daqui.
MAC MARGOLIS , 52, é correspondente
da revista norte-americana "Newsweek"
e vive no Rio há 24 anos
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