São Paulo, sábado, 17 de janeiro de 2004

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FUTEBOL

Das nuvens ao subsolo

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Fazia tempo que eu não sofria tanto vendo um jogo pela TV. Pudera: uma das melhores safras de talentos do futebol brasileira corre o risco de ficar de fora da Olimpíada. O futebol, com sua imponderabilidade, é um esporte ao mesmo tempo fascinante e terrível.
Não sofro daquele patriotismo incondicional que leva alguns brasileiros a torcer pela camisa amarela em qualquer circunstância, mesmo que o nosso time não jogue nada e o rival seja superior.
Quando o Brasil foi eliminado na Copa de 90, só o que me incomodou foi o fato de o nosso algoz ter sido a Argentina.
Mas o caso da seleção pré-olímpica é bem outro. Salta aos olhos a superioridade técnica dos jovens brasileiros sobre os das outras seleções do grupo, Chile incluído.
Nas quatro partidas da primeira fase do Pré-Olímpico, nossa seleção teve lampejos de um grande futebol: um jogo leve, fluido, com toques sutis e vertiginosas triangulações.
O que nos faltou para vencer um Uruguai, um Chile, equipes muito mais limitadas?
Sem entrar em discussões táticas, para as quais não me sinto muito equipado, eu diria que o que nos falta é constância, equilíbrio, organização. Talvez seja por isso que os jogos dessa seleção pré-olímpica me afligem tanto.
É como se estivesse ali um retrato do nosso país, com suas imensas potencialidades sempre abortadas, suas energias dispersas, suas promessas não cumpridas.
Uma seleção como a do Chile parece ter consciência de seus limites, organizando-se de modo a fazer suas parcas forças renderem ao máximo.
Examinemos o gol de empate do Chile contra o Brasil.
O atleta que o marcou, conhecido pelo curioso nome Beausejour, subiu sozinho na área brasileira e cabeceou muito mal. Mas seguiu no lance. A bola (que iria para fora) foi recolocada em jogo por Maicon. E lá estava o bom, o firme, o modesto e confiável Beausejour para colocá-la nas redes, sem nenhuma beleza, sem nenhum brilho, mas com o mesmo valor numérico que um gol de placa.
Talvez seja essa humildade bovina de um Beausejour o que nos falta. Vou tentar explicar melhor.
O Brasil (e já não sei se estou falando do time ou do país), inebriado pela vastidão dos horizontes que desenhou para si, parece oscilar tropegamente entre os delírios de grandeza e o medo do fracasso, o temor de broxar.
Ou somos os melhores do mundo ou os piores. Não há meio termo. Basta ver como ficamos deprimidos quando somos vice-campeões.
A mesma lógica do "tudo ou nada" parece reger nossa economia, que balança entre os grandes planos de salvação nacional e os desastres maiores que os sucedem.
Ou flutuamos nas nuvens ou nos afundamos em subsolos dostoievskianos. Temos dificuldade em caminhar firmemente sobre o chão, com um pé depois do outro. Será que vamos ter de aprender essa arte singela com os nossos esnobados vizinhos de continente?

Consertos e reparos
Só para não dizer que não fiz nenhum comentário concreto sobre o empate com o Chile: acho que Dudu Cearense deveria ter entrado no intervalo, no lugar do volante Fábio Rochemback, que errava um passe atrás do outro e já tinha cartão amarelo. O atacante Daniel Carvalho, por sua vez, deveria ter entrado logo junto com Marcel, a quem poderia servir com seus cruzamentos. Mas não foi por isso que o Brasil deixou de ganhar.

Desemprego brabo
Edílson saiu do Flamengo, Ricardinho saiu do São Paulo. São dois campeões mundiais de 2002 que se desvalorizaram bastante desde então. Estão desempregados. Será que nenhum clube brasileiro tem vaga para eles?

E-mail jgcouto@uol.com.br


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