São Paulo, domingo, 17 de junho de 2007

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Passe errado mudou a vida de Afonso

Aposta de Dunga para o ataque da seleção, jogador diz que falha fechou portas no Atlético-MG e as abriu na Europa

Tímido, jogador, que usa brinco, tem tatuagem no braço e português limitado, declara ser capaz de "chegar aonde o Ronaldo chegou"


DO ENVIADO A TERESÓPOLIS

Não foi como num passe de mágica, mas num passe errado. E a vida de Afonso mudou. Ele não esquece o jogo do Campeonato Brasileiro de 2001 em que, ao tentar acionar um colega, levou seu time, na época o Atlético-MG, a sofrer contragolpe fulminante que terminou em gol do xará paranaense.
"Aquele erro acabou com minha vida no Atlético-MG. Não joguei mais", diz, em tom de lamento, o mineiro de 26 anos, nascido em Belo Horizonte.
Parecia o fim, mas a porta que se fechou lhe mostrou um novo caminho que, seis anos mais tarde, o levaria à seleção.
Pode-se dizer que a vida de Afonso no futebol é tão imprevisível quanto seu futuro na equipe comandada por Dunga.
Afinal, o atacante que disputa lugar hoje com nomes mais badalados, como Fred, Robinho e Vágner Love, era zagueiro no time infantil do Atlético.
Influência do irmão mais velho, Alex, ex-jogador do Cruzeiro. A experiência não durou muito. No juvenil, Afonso já desfilava pelo meio-campo do clube mineiro como volante. Pulou para a meia quando estava nos juniores. E lá ficou até ir para o Malmö, da Suécia.
"Viram que eu tinha qualidade e acharam que precisava jogar mais à frente. Eu tinha um bom chute", conta o jogador.
Ele deve sua quarta mudança de posição ao treinador sueco Erik Comarin, que despertou seu desejo de fazer gols. Gols que o levaram ao futebol holandês e o fazem almejar uma condição que, a esta altura, soa pretensiosa, ainda mais para quem tem somente dois jogos pela seleção e ainda não marcou.
"Teve Romário. Depois, Ronaldo. A cada época vai aparecendo um diferente. Mas acho que posso chegar aonde o Ronaldo chegou", diz ele, sobre seu ídolo e maior artilheiro da história de todos os Mundiais.
Se dentro de campo Afonso diz ter características parecidas com as do "Fenômeno" como a "frieza na hora de finalizar", fora dele estão em mundos completamente diferentes.
De fala mansa e timidez quase irritante, o atacante deixa claro que ainda não aprendeu a lidar com câmeras e microfones. Nos dias de concentração na Granja Comary, é um dos mais requisitados para entrevistas, mas não consegue evitar a gagueira e a voz trêmula.
Os cinco anos na Europa também o fazem, segundo ele mesmo, esquecer algumas palavras em português. Dia desses, não conseguiu responder a um repórter que tipo de comida apreciava no Brasil.
"Sim, tem várias coisas. Gosto da comida da minha mãe, que não vai muito à Holanda porque é muito frio", disse.
"Mas você não respondeu do que gosta. Arroz, feijão...?", insistiu o jornalista.
Visivelmente nervoso, disparou: "Hum, minha namorada, que é européia, já veio para cá, e minha mãe a ensinou a cozinhar algumas coisas."
O repórter desistiu. "Nos times pelos quais passei, não têm brasileiros. Fica mais difícil. Tenho que falar a língua deles. Falo sueco e um pouco de inglês", explica o jogador à Folha, um pouco mais solto, em conversa reservada, longe das câmeras de TV e dos gravadores.
A timidez já despertou até a preocupação de Dunga. "Ele tem me falado que preciso me soltar mais. Os jogadores estão me ajudando muito também", fala o atleta, que parece não combinar com os brincos brilhantes e a enorme tatuagem no braço esquerdo.
Com olhar fixo na exuberante paisagem da Granja Comary, Afonso diz que o passe errado foi uma bênção. E agradece aos dois empresários suecos -não lembra seus nomes- que o tiraram do Atlético-MG.
"Se não deu certo aqui no Brasil, deu lá fora. Isso acontece com muitos jogadores. Não tive muitas chances aqui. Fui para fora e consegui vencer. É um orgulho estar na seleção."0 (EDUARDO ARRUDA)


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