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Atenas taxa voluntários e põe antidoping em risco
Organização decide cobrar hospedagem e alimentação de estrangeiros e
afasta mais da metade dos que trabalharam nos Jogos de Sydney-2000
JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL
Na Olimpíada de maior preocupação com o doping da história,
uma economia dos organizadores
de Atenas põe em risco a eficiência dos controles na competição.
É que eles não pretendem bancar a hospedagem e a alimentação
dos voluntários, que ajudam a
realizar os exames. Decidiram cobrar 70 por dia de cada um, cerca de R$ 258 reais, e a maioria resolveu não ir à Olimpíada, que começa em 13 de agosto.
Segundo o médico brasileiro
Eduardo de Rose, membro do
conselho principal da Agência
Mundial Antidoping, se a organização dos Jogos não mudar de
idéia, "ela poderá ter problemas".
"Os voluntários são pessoas experientes, gabaritadas, sem dúvida é melhor tê-los lá do que não
contar com eles", afirmou. "Já
conversei [com os organizadores], mas ainda nem acabaram de
construir as instalações, talvez seja essa, no momento, a prioridade
dos gregos. Vamos esperar."
A situação preocupa o Comitê
Olímpico Internacional, já que os
Jogos de Atenas serão os primeiros após a descoberta de um novo
esteróide, o THG, e também os
primeiros após os norte-americanos terem sido acusados de encobrir vários casos de doping entre
Seul-1988 e Sydney-2000.
Na Grécia, pela primeira vez na
história será feito controle sistemático para EPO, substância que
estimula a produção de glóbulos
vermelhos e melhora a oxigenação sangüínea dos atletas.
Segundo o COI, nas últimas três
Olimpíadas os voluntários estrangeiros pagavam a parte aérea,
mas nunca hospedagem ou alimentação. O comitê já fez um pedido para a organização mudar
de postura e, pelo menos, reduzir
a diária de 70 pela metade.
"Para nós, da América do Sul, é
ainda mais difícil. Tem voluntário
europeu que até pode pagar, mas
não é o caso de muito brasileiro",
afirmou De Rose.
Uma das baixas na equipe do
médico deve ser o professor de
educação física Alexandre Nunes,
45, que trabalha há 12 anos com
ele e foi o escolta no antidoping
dos judocas Aurélio Miguel e Henrique Guimarães, ambos bronze
em Atlanta-96, e de Rogério Sampaio, ouro em Barcelona-92. "Sou
professor de duas universidades e
treinador de judô. Dificilmente
poderei me afastar do Brasil se tiver que pagar do próprio bolso. "
Nunes lembrou que não só nos
Jogos de Barcelona, Atlanta e
Sydney as despesas dos voluntários do antidoping eram cobertas.
Até no Pan de Santo Domingo,
evento que penou com falta de recursos da República Dominicana,
os gastos que tiveram ficaram por
conta dos organizadores.
A equipe responsável pelo sistema de controle de doping de
Sydney-00 diz que, na Austrália, a
organização arcou com as despesas de cerca de 250 voluntários estrangeiros, "experts em controle
de doping", 160 dos quais não
iriam a Atenas se tivessem que pagar para trabalhar.
Para justificar a economia que
quer fazer com os voluntários do
antidoping, o Athoc cita os aumentos de investimentos que teve
em outros setores, como o de segurança, que pela primeira vez na
história dos Jogos Olímpicos ultrapassou a casa de US$ 1 bilhão.
Além do grupo de De Rose, que
tem dez profissionais de Brasil,
Guatemala, Panamá, Uruguai e
EUA, equipes de Cuba, África do
Sul, Portugal, Espanha e Rússia
têm reclamado da política do
Athoc de não subsidiar os voluntários estrangeiros -cerca de 300
eram esperados para viajar à Grécia e acompanhar o antidoping.
De acordo com Nunes, o trabalho dos voluntários não é simples
"como pode parecer". Em Atenas,
assim como já aconteceu em
Sydney, um dos maiores problemas é realizar os chamados controles fora de competição.
"Achar [alguns] caras é praticamente impossível", disse o brasileiro. Os mais difíceis de serem
encontrados, conta, são os ciclistas, que "treinam em trajetos de
cerca de 120 km". "Na Austrália,
quando chegávamos a um hotel,
eles já estavam em outra cidade."
Quando acabaram encontrando os ciclistas que procuravam
para fazer os exames, novo problema. "Eram todos da região da
ex-Iugoslávia, e os voluntários,
menos eu, tinham como língua
materna o inglês. Resultado, não
conseguíamos nos comunicar
com eles. Aí alguém disse que um
ciclista falava polonês. e eu descobri que ele competia por uma
equipe de Portugal."
"Fiz o controle dele falando português, e meus colegas ficaram
surpresos com o que acharam que
era minha fluência em polonês.
Com isso, pelo menos, fiz meu
nome."
Colaboraram Adalberto Leister Filho e
Luís Ferrari, da Reportagem Local
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