São Paulo, domingo, 18 de junho de 2006

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Símbolos do Mundial são nojentos, diz especialista

Para o designer Erik Spiekermann, logo e mascote não remetem à cultura local

Escolhas da Fifa e do comitê organizador atendem só a patrocinadores e público de fora, diz fundador de uma conceituada agência alemã

GUILHERME ROSEGUINI
ENVIADO ESPECIAL A MUNIQUE

Tudo não passa de desenhos ou criações sem importância a um olhar desapercebido. Mas, sempre que encara o logotipo oficial ou a mascote da Copa, Erik Spiekermann diz entender o repúdio que alguns conterrâneos sentem pela competição mais nobre do futebol.
Na sua visão, estão equivocadas a escolha de cores, os traços do design e até o leão eleito para representar o país. "É muito ruim, é nojento. Coisas assim fazem os alemães não se sentirem em casa num evento tão importante, que lutaram tanto para receber", disse à Folha.
O desabafo não vem de um leigo. Spiekermann é hoje um dos programadores visuais mais respeitados da Alemanha.
Co-fundador da agência MetaDesign, tem clientes como Audi, Volkswagen, IBM e Nike.
Seu principal ataque está direcionado ao logo preparado por duas empresas (uma alemã e outra inglesa) para o torneio.
Segundo ele, três rostos sorridentes, cores da bandeira alemã, a taça da Copa e mais o nome da Fifa são elementos demais em um mesmo desenho.
"É a típica coisa para atender aos patrocinadores. Vira um amontoado. Além disso, aquilo não tem nada a ver com o povo. Não usamos essas cores, não temos esses sorrisos. São outras as nossas tradições."
Ele crê que o emblema de um torneio como a Copa influencia muito as pessoas, pois ganha dimensão nacional. "Ele indica caminhos em metrôs, estradas, estádios. Tem uma função psicológica forte. Imagine um alemão olhando aquilo e pensando: "Onde é que essas carinhas sorridentes vão me levar?"."
Ele culpa a Fifa e o comitê organizador por terem feito uma "escolha direcionada" das agências que criaram o símbolo -seu grupo não participou da disputa. E lembra outro evento esportivo no país, a Olimpíada de 1972, para dar um exemplo de design com qualidade.
"O logo é todo feito em preto-e-branco, com extrema precisão. Não temos que misturar cores nem buscar ser engraçados para conquistar quem vem de fora", disse Spiekermann.
O fracasso de vendas da mascote da Copa, um leão batizado de Goleo -a empresa que adquiriu os direitos entrou em bancarrota-, também não o surpreende. Para o designer, é uma peça criada apenas para o público de outros países.
"Trata-se de um leão, animal não-tradicional na Alemanha. E "Gol" é algo usado por espanhóis e brasileiros. "Leo" é uma abreviação latina, italiana talvez, para leão. Da nossa cultura, não há nada", explicou.
O bicho também é usado nos estádios. A cada gol, Goleo aparece na tela e dá um rugido.
"É mais um desastre", ataca o designer. "Querem empurrar a mascote de qualquer jeito ao público, criar jogadas de marketing. Isso não funciona."
Novamente, 1972 vem à tona. "Na época da Olimpíada, usaram um cão da raça dachshund como mascote, uma espécie muito popular em toda a Bavária. Foi um sucesso."
É essa valorização da Alemanha que Spiekermann queria encontrar, já que tais símbolos poderiam ajudar a resgatar o nacionalismo alemão.
"Parece que, por termos uma história recente tão ruim, por termos sido o berço de Hitler, não podemos sentir orgulho. Quem cuidou do design se preocupou em fugir de tudo o que é mais comum no país. Pode agradar a quem vem de fora, mas não faz o menor sentido para quem vive aqui", afirma.
Do outro lado, há quem discorde. Alexander Koch foi escolhido pela Fifa para cuidar de toda a programação visual da Copa. Ele diz respeitar as críticas de Spiekermann e outros designers. Mas se defende.
"Em 2004, quando o logo foi lançado, ao menos 50% das críticas que recebemos foram positivas. Como não encontram nada para falar mal no Mundial, resolveram atacar o nosso emblema", disse à Folha.
Sobre Goleo, Koch reconhece que um leão não tem identificação imediata com a Alemanha. Mesmo assim, considera a escolha acertada.
"É um animal que agrada às crianças, passa uma mensagem de carinho e força ao mesmo tempo. Foi ótimo colocar um clipe com ele nos estádios. A cada gol, o público vai vibrar e aprender a gostar da mascote."


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