São Paulo, domingo, 21 de maio de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TOSTÃO

O sonho continua

Torci para o Barcelona ganhar o título europeu como se fosse um apaixonado torcedor. O time é uma mistura da maneira de jogar do passado com o presente, do talento individual com o coletivo, do estilo bonito com a objetividade, da ofensividade com uma forte marcação por pressão.
O Barcelona, sem ser tão espetacular, me lembra o Santos de Pelé. O time espanhol não apavora nem tem pressa de virar e ganhar uma partida. Raramente os jogadores se livram da bola sem um objetivo e trocam passes pelos lados, pelo meio, de um lado para outro, até aparecer uma boa chance de fazer o gol. Fazem isso contra o pior time espanhol e em uma final de Copa dos Campeões.
Uma diferença positiva do Barcelona para os grandes times do passado é a preocupação em recuperar rapidamente a bola.
O desenho tático do Barcelona é muito parecido com o do Cruzeiro e de outras equipes brasileiras dos anos 60, com uma linha de quatro defensores, um volante, dois meias e três atacantes (dois pelos lados e um centroavante). Mas os "pontas" do Barcelona não são fixos com os do passado. Ronaldinho e Eto'o trocam muito de posição, porém há sempre um atacante aberto dos dois lados.
Contra o Arsenal, Ronaldinho jogou a maior parte do primeiro tempo pelo meio. Quando ele atua pela esquerda, entrando pelo meio, é mais eficiente. Provavelmente, o técnico Rijkaard queria que o Ronaldinho recebesse a bola pelo meio para servir ao veloz Eto'o, entrando em diagonal da esquerda para o centro. Assim ocorreu o lance da expulsão do goleiro Lehmann. O Barcelona foi prejudicado pelo árbitro que deveria seguir a jogada e dar o gol.
Rijkaard tem o grande mérito de sair da mesmice de quase todos os treinadores do mundo. Qualquer técnico é capaz de armar uma forte defesa para contra-atacar, como fez o Arsenal durante toda a Copa dos Campeões. Difícil é inovar e arriscar com segurança, como o Barcelona. Para isso, é preciso também ter ótimos jogadores.
Ronaldinho não deu show contra o Arsenal, mas mesmo quando não atua muito bem dá uns três passes decisivos. Se o gol da vitória do Barcelona tivesse saído de um desses lances, como o da expulsão do goleiro Lehmann, diriam que ele decidiu o jogo.
É preciso também repensar o lugar comum de que o craque tem sempre de ser o grande jogador das partidas decisivas. Futebol é coletivo. Após o jogo, escutei até que o Ronaldinho mostrou novamente que não é jogador de decisão. Aí é demais.
Pelé disse que Ronaldinho Gaúcho não é ainda um fato e que ele não foi destaque na Copa de 2002. Não é surpresa o Pelé dizer isso. Ronaldinho não jogou tanto quanto Rivaldo e Ronaldo, mas teve excepcionais atuações, como no lance do primeiro gol do Rivaldo contra a Inglaterra. Isso sem falar no segundo de falta contra os ingleses.
Além disso, criar jogadas e dar passes espetaculares é tão objetivo quanto fazer os gols.
Sei da importância de uma Copa do Mundo para a carreira de um jogador, mas querer também concluir sobre o talento do Ronaldinho por apenas sete jogos, é uma grande injustiça. Zico não teve atuações excepcionais nas duas Copas que jogou e foi um dos grandes craques da historia do futebol.
Após o mundial de 2002, por causa do enorme crescimento técnico do Ronaldinho Gaúcho e do Kaká e do aparecimento do Robinho e do Adriano, escrevi várias vezes que a seleção pode mostrar em 2006 um futebol tão fascinante quanto às de 58, 70 e 82.
O sonho continua.

@ - tostao.folha@uol.com.br


Texto Anterior: Grandalhões encontram seus iguais na competição
Próximo Texto: Argentina se torna mais rival e íntima
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.