São Paulo, domingo, 21 de junho de 2009

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Bairro mais temido muda com Copa

Região com os mais altos índices de criminalidade da África do Sul fica a só 10 minutos de um dos principais estádios

Para moradores de Hilbrow, Mundial tem conseguido atrair investimentos para o local e ajudado a minimizar os números da violência

DOS ENVIADOS A JOHANNESBURGO

As placas à mostra no caminho já dão o aviso aos motoristas: "Área de alto índice de crime. Por favor, desligue o celular e concentre-se".
A poucos metros dali está Hilbrow, o bairro mais temido não apenas de Johannesburgo, mas de toda a África do Sul, no qual os índices de criminalidade são assustadores.
O carro da Folha adentra as ruas lotadas de Hilbrow. São mães carregando crianças nas costas, presas por um tipo de pano, vendedores ambulantes e até cabeleireiro fazendo penteado no meio da rua. Mas a grande maioria só conversa, sem fazer nada mesmo.
São muitos grupos assim. Ficam no meio da rua, em frente aos prédios e às casas, boa parte deles mal conservada. A reportagem começa a percorrer as ruas. Os olhares dos locais são desconfiados.
Afinal, os brancos sul-africanos não ousam andar por ali. Um homem se aproxima. É Daniels Kanu, nigeriano, que vive em Hilbrow há sete anos.
Ele se oferece como guia. "Hilbrow carrega essa fama de violenta, mas não é mais assim. A polícia deu um jeito no lugar. Hoje é tranquilo vir aqui, especialmente nesta época de Copa do Mundo", afirma. "Perigoso mesmo é Lagos, minha cidade", acrescenta, referindo-se ao principal município nigeriano.
Mas e os índices altíssimos de assassinatos? No ano passado, houve 36 por grupo de 100 mil habitantes na África do Sul. Como comparação, no Brasil são 25 por 100 mil.
Em Hilbrow, esse número já foi de cem mortes por 100 mil habitantes. "Olha, o último que me lembro aqui foi em 2003", conta Daniels, sem ter muita certeza. O problema da violência na África do Sul, de acordo com pesquisas de opinião realizadas no país, é o que mais preocupa a população.
A caminhada de mais de uma hora da reportagem pelas ruas do bairro durante uma manhã ensolarada em Johannesburgo mostra um local, pelo menos na aparência e nessa hora do dia, bastante tranquilo.
"Eu não troco Hilbrow por nada", declara Naomi Bathmaka, 24, que trabalha como garçonete em Sandton, um dos locais mais elegantes de Johannesburgo. "Nunca me aconteceu nada aqui. Hilbrow se tornou um lugar seguro para viver", afirma a moça, que vive no bairro desde 2005 com o marido e o filho de quatro anos.
Uma das preocupações da polícia local e dos organizadores da Copa é o fato de Hilbrow estar situado a menos de dez minutos, a pé, do Ellis Park, um dos mais importantes estádios do Mundial do ano que vem.
Os moradores de Hilbrow dizem que isso contribuiu para a diminuição da criminalidade no local. "Houve um investimento maior nessa área, e o preço dos imóveis aumentou até aqui em Hilbrow", declara Ekhaya Burotab, que caminhava pela principal praça do bairro acompanhado da mulher.
"Temos um filho e achamos bom que ele cresça aqui", diz ele, que também não pensa em deixar Hilbrow. O casal até pretende abrir uma guest house, espécie de pensão familiar, para receber turistas durante a Copa do Mundo de 2010.
A mulher de Daniels, Eva, aparece. Ela diz já ter sido assaltada no bairro uma vez, durante o dia. "Levaram a minha bolsa enquanto eu falava no celular", conta. "Mas gosto daqui. É conveniente morar aqui pelo fato de estar perto do Centro", afirma ela, que é secretária.
Enquanto ela é entrevistada, um carro de polícia passa pela rua, devagar, e para. É o chefe de polícia local de Hilbrow, que se apresenta como Nelson.
Quando questionado sobre a fama de violenta da região, ele declara: "Vocês estão aqui, tiveram algum tipo de problema? Não. Então, isso é Hilbrow, mas é claro que não se deve andar à toa por aqui, especialmente nessas noites frias de Johannesburgo".
(EDUARDO ARRUDA E PAULO COBOS)

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