São Paulo, segunda-feira, 22 de março de 2010

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Laços políticos comandam África-2010

Membros do governo e pessoas ligadas ao presidente sul-africano ocupam principais postos do comitê organizador

Chefe do órgão que gerencia a Copa do Mundo é pai de uma garota com quem o mandatário do país, Jacob Zuma, acaba de ter um filho

FÁBIO ZANINI
DE JOHANNESBURGO

No papel, a Copa do Mundo da África do Sul é organizada de maneira independente do governo e não tem coloração partidária. Na prática, virou uma peça da política sul-africana e está totalmente subordinada aos interesses do presidente, o polêmico Jacob Zuma.
Pelo menos sete ministros, além de diversos membros do partido governista, o Congresso Nacional Africano (CNA), e pessoas diretamente ligadas ao presidente ocupam postos- -chave no comitê organizador.
O presidente do órgão, Irvin Khoza, é pai de uma garota com quem Zuma acaba de ter um filho. Nkosazana Zuma, uma das ex-mulheres do presidente e atualmente ministra do Interior, também está lá.
A lista é longa e começa no topo. Danny Jordaan, principal executivo do comitê organizador, fez sua carreira subindo as estruturas locais do CNA. Entre 1994 e 1997, foi deputado federal pelo partido. Khoza, além da ligação "familiar" com o presidente, é um empresário que financiou o CNA nos anos de exílio na década de 80.
Além da ex-mulher de Zuma, estão no comitê da Copa os ministros Jeff Radebe (Justiça), Makhenkesi Stofile (Esporte), Sicelo Shiceka (Comunidades Tradicionais), Susan Shabangu (Mineração), Sibusilo Ndebele (Transporte) e Tokyo Sexwale (Habitação). Este último é apontado como possível presidente da África do Sul quando Zuma terminar seu mandato, daqui a quatro anos.
Também há membros das pastas das Finanças e das Relações Exteriores. Todos com direito a voz e a voto, recebendo jetom de cerca de US$ 1.000 mensais e servindo como olhos do governo sobre o trabalho de Jordaan e das pessoas com perfil mais "executivo" no comitê.
Zwelinzima Vavi, presidente da influente Cosatu, a maior central sindical sul-africana, é outro governista no comitê. Na África do Sul, a Cosatu faz parte oficialmente do governo Zuma. O presidente emplacou ainda um aliado na estratégica área que cuida dos preparativos de segurança para a Copa.
Linda Mti é um ex-ministro responsável pelo sistema prisional e ex-deputado federal que tem uma longa lista de polêmicas. A mais recente, a de ter recebido presentes de empreiteiras que construíram prisões. Ele nega conflito de interesses.
Por fim, na área responsável pela logística, está Skhumbuzo Macozoma, ex-diretor do Ministério dos Transportes.
O perfil chapa-branca do comitê organizador reflete uma realidade financeira: praticamente todo o orçamento de R$ 8 bilhões da Copa do Mundo saiu dos cofres públicos.
Para Chris Fortuin, pesquisador da história do futebol sul--africano ligado à Universidade de Johannesburgo, isso é consequência do fato de que o Mundial já nasceu político.
"Quem conquistou esse evento para a África do Sul foi [o ex-presidente] Nelson Mandela, com o argumento de que era importante para consolidar a democracia racial do país", afirmou o pesquisador.
Segundo ele, faltam empresários e pessoas especializadas em eventos esportivos trabalhando no comitê organizador.
"Seria mais saudável ter pessoas com diferentes trajetórias. O governo quer se legitimar perante as classes mais pobres mostrando que é ele o único responsável por organizar a Copa", disse Fortuin.
Nem todos no comitê organizador sul-africano são ligados ao governo. Há membros com trajetória na iniciativa privada responsáveis por áreas como comunicações, logística, marketing e finanças. Mas são apenas seis pessoas de perfil "técnico", uma minoria, portanto.
Embora Jordaan negue interferência de Zuma ou do CNA no dia a dia do comitê, há exemplos claros disso. A política de preços de ingressos para a Copa, reservando uma cota com desconto para os sul-africanos, foi um pedido direto do presidente do país-sede do Mundial.


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