São Paulo, sexta-feira, 22 de outubro de 2004

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AUTOMOBILISMO

GP Brasil descumpre lei já usada em estádios de futebol que garante a torcedor assento predeterminado

Antiestatuto, Interlagos não marca lugar

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Rodrigo Botana, 29, é um fanático por F-1. Já esteve em Interlagos em 1994, 2001 e 2002, sempre no setor G, a arquibancada mais barata, que neste ano custa R$ 280 para os três dias de evento.
Morador de Guarulhos, acordava na madrugada para garantir lugar. Mas, neste final de semana, não estará no autódromo. "Sempre gostei de F-1. Comprava até revista importada. Só que no ano passado já não fui para a corrida. Além de ser muito caro, as arquibancadas não são marcadas. Já saiu briga na minha frente por causa desse problema. Um cara chegou tarde, quis sentar lá em cima e virou confusão", conta.
Confusão que pode se repetir neste ano. Contrariando o Estatuto do Torcedor, sancionado em 15 de maio do ano passado, nenhuma das dez arquibancadas do GP Brasil possui lugares marcados. Nem o "popular" setor G nem o elitista E, que custa R$ 1.550.
O artigo 22 do código, primeira lei sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, classifica como direitos do torcedor "que todos os ingressos emitidos sejam numerados" e que ele ocupe "lugar correspondente ao número constante do ingresso".
Em 2003, o artigo provocou correria dos clubes de futebol, que tiveram que marcar lugares nos estádios. Mas na primeira edição pós-estatuto do evento esportivo que mais gira dinheiro no país, a etapa da F-1, isso não aconteceu.
Assim, a partir de hoje, com o início dos treinos livres, uma cena que se tornou tradição em Interlagos se repetirá: torcedores deixando as arquibancadas ao fim do dia e já entrando na fila para as sessões de amanhã. Muitos torcedores passam a noite nas calçadas, esperando que os portões do circuito sejam reabertos.
A diferença é que, agora, os torcedores podem reclamar. "Qualquer pessoa que comprou ingresso para o GP pode entrar com ação no Procon", diz o advogado Marcílio Krieger, especialista em direito esportivo, um dos autores do Código Brasileiro de Justiça Desportiva. "Essa história de ficar na fila de madrugada não tem que existir. O estatuto existe para garantir o conforto e a segurança."
Para Krieger, muita gente ainda acredita que a lei vale apenas para o futebol. "O estatuto é aplicado ao desporto profissional, e talvez não exista nada tão profissional como a F-1. O torcedor pode pedir indenização pelo desconforto de não ter um lugar marcado."
Vice-presidente do IBDD (Instituto Brasileiro de Direito Desportivo), o advogado Gustavo Oliveira concorda. "É um descumprimento do estatuto, com o agravante moral de se tratar de um evento internacional com tanto dinheiro. O torcedor pode alegar dano moral por ter ficado num lugar horrível na arquibancada ou por ter passado a noite na fila."
"A falta de lugares marcados nas arquibancadas vai contra o Estatuto do Torcedor, não interessa se os setores são provisórios ou permanentes", afirmou o promotor Fernando Capez, do Ministério Público Estadual.
Segundo os advogados ouvidos pela Folha, poderiam ser responsabilizadas, com base no estatuto, a Interpub, empresa promotora da corrida e que fica com a arrecadação da venda de ingressos, a Prefeitura de São Paulo, que tem contrato com a FIA (entidade máxima do automobilismo), e também a CBA, confederação brasileira, que chancela o evento.
Em São Paulo, o site do Procon é o www.procon.sp.gov.br.
Todos os ingressos para o GP foram vendidos. Há apenas entradas para os treinos, com preços entre R$ 80 e R$ 190. Ao todo, 70 mil pessoas estarão nas arquibancadas no domingo. Mas não adianta já terem o ingresso. Precisam correr. Para guardar lugar.


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