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FUTEBOL
Bom e mau humor
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Antes da partida do Corinthians contra o Pumas do
México, Antônio Lopes disse que
o fisiologista Renato Lotufo escalaria o time, pois havia muitos jogadores cansados.
Para medir a fadiga dos atletas,
o fisiologista, segundo noticiários,
utiliza a variação da freqüência
cardíaca, a dosagem da enzima
ck, que aumenta quando o jogador está cansado, e um questionário para avaliar o humor e o estresse.
Essa avaliação é mais uma
constatação da evolução científica das comissões técnicas dos
principais clubes e da seleção brasileira. Nisso, o Brasil está, no mínimo, no nível dos países mais
adiantados.
Mas esse avanço é mais uma
evidência de que o Brasil é o país
dos contrastes. De acordo com o
IDH (Índice de Desenvolvimento
Humano), que mede a qualidade
de vida da população, o Brasil está em 63º lugar no mundo, atrás
da Argentina (34º), do Chile (37º)
e do Uruguai (46º).
Como escreveu José Roberto Torero, em vez de país do futebol, orgulho maior seria se fôssemos o
país da democracia, da honestidade, sem fome e sem tanta violência.
Volto às comissões técnicas. Já
escrevi que a do Cruzeiro, quando
iniciei a minha carreira profissional em 63, era formada por um
médico ginecologista, um treinador que dava também os exercícios físicos -eram apenas levantar e abaixar os braços e testar o
reflexo por meio da brincadeira
do "macaco disse"-, um auxiliar
que apitava os treinos e tratava
da burocracia, um massagista
que era também responsável pelos assuntos sobrenaturais e um
enfermeiro que cuidava ainda do
humor dos atletas.
Hoje, as comissões técnicas dos
principais clubes e da seleção possuem um grande número de ótimos especialistas, fora os assessores e seguranças. Apesar de todo
esse avanço científico e do exemplo de outros esportes, muitos dirigentes, treinadores e até médicos não gostam de psicólogos.
Acham que eles podem "fazer a
cabeça" dos jogadores. Muitos
técnicos só gostam de atletas obedientes e conformados.
Em vez dos psicólogos, muitos
clubes preferem os motivadores,
com seus discursos óbvios e redundantes, para darem palestras
antes das partidas.
Poucos técnicos, como Luxemburgo e Felipão, utilizam o trabalho constante dos psicólogos. Zagallo e Parreira preferem o engenheiro motivador Evandro Mota,
que dá palestras para a atual seleção e participou da Copa de 98,
quando Zagallo era o treinador.
Depois que se tornou diretor das
categorias de base da CBF, o ex-jogador Branco trocou o trabalho
da psicóloga pelas palestras do
Evandro Mota. Não foi por isso
que a seleção perdeu vários títulos
nos últimos anos nas categorias
sub-17 e sub-20 e a sub-23 foi desclassificada para as olimpíadas,
mas foi um retrocesso. Os jovens
precisam mais do que os adultos
de orientação e de mais apoio psicológico para conter as suas
agressividades.
Mas o que estou curioso é para
saber os detalhes do questionário
sobre o humor e o estresse, adotado pelo competente fisiologista
Renato Lotufo, do Corinthians, e
que ajuda na avaliação da fadiga. Será que as perguntas foram
feitas pelo fisiologista, por um psicólogo ou por um motivador?
Será que o Petkovic, conhecido
pelo seu mau humor, passaria
nesse teste? Dizem que o Pet joga
muito melhor quando está mal-humorado. Conheci vários jogadores com esse comportamento.
Além disso, há algumas pessoas
bem-humoradas que são sempre
pessimistas, apáticas e pensando
em grandes tragédias. Já outras,
mal-humoradas, são otimistas e
não param de lutar pelos seus objetivos. São as contradições humanas.
Existe ainda um mito no futebol
de que todo jogador para se entrosar no grupo precisa ser bem-humorado, extrovertido e saber
tocar, dançar e cantar samba.
Quando os jovens assistem pela
TV ao Ronaldinho Gaúcho fazer
tudo isso com um enorme sorriso,
querem fazer o mesmo, já que
não podem imitá-lo em campo.
Mesmo após o noticiário do escândalo do apito, imagino que o
ex-árbitro Edilson Pereira de
Carvalho tiraria uma boa nota
no teste de estresse e humor. Ele
contou todos os detalhes para os
repórteres do que fez sem nenhuma vergonha, nenhum sentimento de culpa e sem estresse. Para o
árbitro, seu único erro foi ter sido
descoberto. Se não fosse isso, ele se
consideraria um homem esperto e
de bem.
E-mail - tostao.folha@uol.com.br
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