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FUTEBOL
Entusiasmo, desânimo, entusiasmo...
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
"Ciclotimia: Instabilidade persistente do humor
que leva a uma alternância sucessiva de períodos de depressão e
outros de hiperatividade ou de
excitação." (do Dicionário de
Termos Relacionados à Dor, no
portal Dor on Line).
Existe definição melhor para o
estado de ânimo do torcedor brasileiro? Ou de todo brasileiro, como já escreveram, entre outros,
Daniel Piza e Matthew Shirts.
Mas, nessa alegoria chamada esporte, a ciclotimia se manifesta
com esplêndido vigor.
Em breves 90 minutos, o torcedor se transfigura várias vezes:
uma hora vaia seu time com ódio
e desgosto, xinga a terceira geração do centroavante; manda todo
mundo para o inferno. Dali a
pouco é capaz de urrar de alegria
e orgulho desse time que não tem
igual, que não tem pra ninguém,
que é o terror dos adversários e,
sem dúvida, vai ser campeão.
Mas, se o comentarista disser,
no primeiro tempo, que "fulano
não está fazendo nada" e, no segundo, fizer um golaço, o torcedor
não vai perdoar. Vai dizer que a
besta do comentarista errou.
Às vezes, eles concordam, mas
não adianta. O fanático sai da lista de discussões na internet, onde
escreveu que "esses m. ganham
muito dinheiro, mas não fazem p.
nenhuma", e ouve na TV que seu
time é medíocre e não chegará a
lugar nenhum. Volta à internet:
"medíocre é essa mídia de m. que
só dá valor a seus queridinhos".
Por outro lado, elogios -ao
Santos, a Diego e Robinho, Kaká,
Ronaldo, Romário ou qualquer
outro- também despertam ira e
indignação. A cada tropeço do
elogiado, você é intimado: "Cadê
o craque? Cadê o melhor time do
Brasil? É tudo produto de mídia,
tá mais do que provado!".
Acho que essa desconfiança é típica mesmo do torcedor. Se um
artista lança um disco maravilhoso e não passa disso, ele é chamado de "one-hit-wonder", ou a
maravilha de um sucesso só. Pode-se até desconfiar da máquina
da gravadora que o promoveu,
mas aquela música gostosa, bem-feitinha, de boas lembranças, vai
continuar sendo uma das suas favoritas, mesmo que o autor desapareça. Grandes atores às vezes
fazem filmes medíocres, com roteiros e diretores ruins, e são criticados por isso, mas ainda têm o
crédito por seus bons momentos.
No esporte, não -se o Guga nunca mais for o número um, vão dizer que aquilo tudo foi sorte. Que
os outros é que eram ruins.
Sem entrar no papo bom sobre
como definir um craque, só queria dizer o seguinte: para mim,
Kaká, Robinho e Diego fizeram
até agora, em suas curtas carreiras, muito mais coisas boas (lances geniais, jogadas bonitas e decisivas) do que a maioria de seus
contemporâneos em tempo equivalente. Se vão manter essa incidência daqui para a frente, não
sei. Mas, até aqui, não foram
"normais", comuns. Me dou o direito de não achar a menor graça
nos seus jogos ruins e de achar
muita graça nos momentos bons,
deles e de todos os outros, sem decidir que o momento brilhante ou
o medíocre é que é o "definitivo".
E sem ciclotimizar, eu espero!
Bairrismo??
Um torcedor do Cruzeiro viu
nos meus protestos contra a
"escalação" brasileira na Copa
Sul-Americana "mais uma manobra bairrista dos paulistas".
Quebro a cabeça imaginando
que vantagem eu levo defendendo os direitos do Atlético-MG e do Juventude e não acho
uma. Outros reclamam do destaque dado ao Alexandre Kalil,
que seria prepotente, interesseiro etc. Entendo a preocupação, mas em situação idêntica,
eu defenderia o Vasco "do Eurico", o Paysandu "do Tourinho" ou qualquer outro. São os
times que estão sendo prejudicados, não apenas os cartolas. E
o benefício que pode surgir
dessa briga é a possibilidade de
ter o futebol administrado com
mais honestidade, o que é bom
também para os cruzeirenses.
E-mail
soninha.folha@uol.com.br
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