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PELÉ OFFSHORE
Contador afirma que ex-ministro dos Esportes nunca declarou à Receita movimentação em paraísos fiscais
Pelé omite conta pessoal nas Bermudas
MÁRIO MAGALHÃES
SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO
Contrato anexado a um processo da Justiça do Rio e descoberto
pela Folha revela que o ex-ministro dos Esportes Edson Arantes
do Nascimento, o Pelé, abriu e
usou uma conta bancária pessoal
no Bank of Bermuda, no paraíso
fiscal das Bermudas (Caribe).
A manutenção de contas fora
do país é permitida pela legislação
brasileira, que no entanto obriga
o contribuinte a declará-las à Receita Federal.
O contador responsável pelas
declarações de renda de Pelé como pessoa física desde a década
de 1970, Nilton Chagas, afirma
que o maior jogador de futebol da
história nunca informou ao fisco
a existência de conta no exterior.
O motivo, segundo Chagas, é que
nunca existiu uma.
A Folha revelou ontem, com
base em processos que tramitam
na Justiça, que Pelé, 62, e seu ex-sócio Hélio Viana, 45, organizaram seus principais negócios nos
últimos 15 anos em torno de empresas de paraísos fiscais.
As firmas Vinas Inc. e PS&M
Inc. (Pelé Sports & Marketing
Inc.) são das Ilhas Virgens Britânicas; a Leros Ltd., das Bahamas; e
a Glory Establishment, de Liechtenstein. Os processos mostram
pelo menos cinco contas das empresas no exterior e recibos de depósitos nelas.
Segundo Viana e o contador
Chagas, nenhum dos ex-sócios jamais declarou a posse das empresas à Receita porque, afirmam,
não são seus donos.
Conforme documento rubricado e assinado por Pelé e reconhecido como autêntico por ele e seus
advogados na Justiça, pelo menos
uma conta pessoal existe.
Em setembro de 1989 o ex-atleta
celebrou contrato com a Focus
Communications, da Ilha Jersey,
paraíso fiscal do canal da Mancha.
O acordo assinado por Pelé determinou onde deveria ser depositada a sua remuneração: no Bank of
Bermuda, em Hamilton (capital
da colônia britânica), na conta
0141598, em nome de Edson
Arantes do Nascimento. A única
possibilidade de o pagamento
não ser feito nesta conta seria notificação enviada por Pelé.
A correspondência da Focus para Pelé, inclusive com o aviso de
depósitos, deveria ser enviada para David R. M. Lang, do Bank of
Bermuda, com cópia para o advogado de Pelé em Nova York.
Pelo contrato com a Focus, Pelé
receberia apenas US$ 20 mil por
dez dias de gravação de programas sobre futebol para a TV.
Em outro trato, exatamente pelos mesmo serviços do antigo jogador, a Focus se comprometia a
pagar à Leros Ltd. US$ 480 mil
mais 10% do que excedesse a receita bruta de US$ 3 milhões na
venda dos programas.
De acordo com um advogado
de Pelé em outro processo judicial
(2002.209.006075-2, da 1ª Vara Cível da Barra da Tijuca), Arnaldo
Blaichman, a Leros Ltd. pertence
ao ex-ministro.
Diretor-presidente
O contrato entre Pelé e a Focus
foi anexado ao processo
94.001.013187-7 pela empresa International Sports Ltd., também
de paraíso fiscal, as Bahamas. O
processo, já arquivado, tramitou
na 35ª Vara Cível do Rio.
Nasceu de uma ação indenizatória da International Sports contra Pelé, pessoalmente, e a PS&M
Inc. Em novembro de 1992, a International Sports e a PS&M Inc.
registraram em cartório do Rio
um contrato para realizar um
projeto ("Pelé's World of Football") com Pelé semelhante ao
que ele vendera à Focus, usando
outra empresa, a Leros Ltd.
Pelé e a PS&M Inc. prometeram
à International Sports exclusividade na "produção de programas
similares". Mas, três anos antes,
Pelé e a Leros Ltd. haviam assegurado exclusividade por quatro
anos à Focus.
Ao rescindir o contrato e pedir
reparação, os advogados da International Sports -Raphael de Almeida Magalhães e Alcindo Medeiros Caldas- se referiram à Leros Ltd. e à PS&M Inc. como empresas de propriedade de Pelé.
A Folha não encontrou nos autos rejeição do ex-jogador ou seus
representantes a essa afirmação.
Seria difícil: Pelé assinou o contrato com a International Sports
na condição de diretor-presidente
da PS&M Inc. Hoje, no processo
da Barra da Tijuca (zona oeste do
Rio), o advogado Blaichman diz
que a empresa pertence a Hélio
Viana, e não a Pelé, embora reconheça que o ex-ministro é o dono
da Leros Ltd. e da Glory.
Blaichman também sustenta
que Pelé ouviu falar da PS&M Inc.
pela primeira vez em novembro
de 2001, numa série de reportagens da Folha.
Os acordos da Leros e da PS&M
Inc. foram celebrados quando Pelé e Viana eram sócios -a ruptura foi em 2001. À Suprema Corte
do Estado de Nova York, advogados de Pelé se referiram em 1993 a
Viana como "um dos dirigentes"
da PS&M Inc. A Lei 8.137/90 afirma que constitui crime "(...) omitir declaração sobre rendas, bens
ou fatos (...) para eximir-se, total
ou parcialmente, de pagamento
de tributo". A pena é de detenção
de seis meses a dois anos e multas.
Empresas, contas e rendimentos no exterior precisam ser declarados para, quando for o caso, o
contribuinte recolher os impostos. Não há investigação da Receita ou processo judicial tratando
das empresas operadas no exterior por Hélio Viana e Pelé, nem
sobre a conta que este informou
manter nas Bermudas.
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