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Louvado seja Dios
Criticado como treinador antes do início do Mundial, Maradona agora é reverenciado pela campanha vitoriosa
da Argentina e monopoliza atenções
FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES
"Mira, mira, mira, mira",
grita a voz no fundo do salão.
Não é Messi. Não é Tevez.
Não é Higuaín. Tampouco é
um gol. Ou uma bela jogada.
O telão mostra Maradona
cometendo o assombroso
gesto de ajeitar a gravata.
"El Pibe de Oro", quando
surgiu para o futebol. "El
Diez", quando jogava. E que,
hoje, só vê crescer o simbolismo de seu outro apelido.
Dios.
Onipresença. Religião. Fanatismo. Devoção. Eram para ele que estavam voltados
os olhos dos argentinos ontem. A Folha acompanhou
Argentina x México no clube
Zárate, espécie de Portuguesa da Boca, fundado em 1929
e a cinco quarteirões do La
Bombonera, o estádio do irmão mais famoso. Buenos
Aires foi a 17ª parada da série
"Um Mundo Que Torce".
Se é verdade que, antes da
Copa, havia dúvidas sobre a
capacidade de Maradona como treinador, também é que,
após quatro vitórias na Copa,
elas foram para o espaço.
Começando pela imprensa. "A seleção passou de incógnita a candidata", decretou o colunista Martin Eula,
no "Olé". "Precisamos saber
lidar com o favoritismo", escreveu o ex-jogador Simeone, no "La Nación".
Terminando no torcedor.
"Não consigo entender como
havia gente que criticava o
Maradona. Ele é um gênio,
sempre foi", declara Jose Masina, proprietário de uma
barbearia na Recoleta.
Um deus, claro, com poderes sobrenaturais. "Diego estava morto. Renasceu. Um
mês atrás, não davam um
centavo por ele. Agora, vai levar a Argentina ao terceiro
Mundial", lança, animado,
Luis Sanchez, vendedor de
camisetas piratas na Boca.
As de Messi fazem sucesso
com os jovens. "Mas quem
viu futebol a vida toda, compra a do Maradona", sorri.
O jogo começa, e os turistas que lotavam as ruas da
Boca desaparecem. Até porque os vendedores das barraquinhas também somem: estão todos nos bares e restaurantes, ligados nos telões.
O México está bem. Uma
bola no travessão arranca
"ooohs!" dos argentinos.
Mas a tensão dura pouco.
Aos 25min, Tevez marca.
Higuaín amplia. Tevez faz
o terceiro gol no início do segundo tempo. Em comum, os
jogadores correm para Maradona. Na Boca, os torcedores
suspiram por Dios.
O gol do México quase não
é notado: 3 a 1, e a Argentina
classificada para as quartas.
"Agora o nível é outro.
Agora, com Diego, estamos
entre os oito melhores", diz o
locutor da rádio, enquanto o
repórter parte para o Obelisco, ícone de Buenos Aires.
Monumento convertido,
ontem, em templo. Milhares
de torcedores comemoraram
a vitória, louvaram seu ídolo
de terno e gravata.
Templo que, esperam, logo será profanado: Maradona prometeu correr nu ali caso a Argentina seja campeã.
Difícil dizer para onde iria
a idolatria. Porque, na Argentina, impossível imaginar poder maior que o de Dios.
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