São Paulo, domingo, 30 de outubro de 2005

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PAN-AMERICANO

Poluição inviabiliza provas de esqui aquático nas lagoas da Barra da Tijuca e ameaça levar mau cheiro à Vila

Rio-07 estuda atirar atletas em "lixeira"

SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO

O Co-Rio (comitê organizador do Pan) quer colocar os esquiadores para competir numa ""lixeira aquática" em 2007.
Com o impedimento de levar o esqui aquático para a lagoa Rodrigo de Freitas, que vai abrigar as provas de remo e canoagem, o poluído sistema lagunar da Baixada de Jacarepaguá está na mira dos organizadores do evento. Na quinta-feira, o Co-Rio divulgou que as lagoas da zona oeste estão em estudo para receber os esquiadores no Pan de 2007.
Se não for lá, a modalidade terá que realizar as provas fora do Rio. O esqui aquático é o único esporte sem local de disputa confirmado pelo Co-Rio. Todos os outros 33 vão ocorrer na cidade.
""Será um assassinato colocar qualquer pessoa dentro dessas lagoas. No melhor trecho daqui, só vacinado contra hepatite A e B. Mesmo assim, é loucura. Isto é uma verdadeira lata de lixo", disse o biólogo Mário Moscatelli, especialista na região, que vai apresentar um dossiê sobre a situação na Câmara Municipal do Rio.
Este sistema da zona oeste é formado pelas lagoas da Tijuca, Camorim, Lagoinha, Jacarepaguá e Marapendi. Todas estão poluídas pelo esgoto dos condomínios de luxo da Barra da Tijuca e das favelas do bairro, pelo lixo e por algas tóxicas. Vários trechos estão assoreados -em alguns lugares, peixes já não vivem mais.
Diariamente são lançadas nas águas das lagoas cerca de 3.600 litros por segundo de esgoto. A lagoa da Tijuca, por sua vez, tem cerca de 6 milhões de metros cúbicos de lama e lixo. A água já até mudou de cor lá. Está verde por causa das algas tóxicas geradas pelo acúmulo de poluição.
Em 1997, a lagoa da Tijuca registrou 16 milhões de coliformes fecais por 100 ml de água -1.600 vezes o permitido pela legislação federal para a balneabilidade. ""Além de colocarem a saúde em risco, os atletas terão que desviar de obstáculos insólitos", declarou Moscatelli.
Anteontem, a Folha percorreu as cinco lagoas. Três sofás, cinco pneus e três bolas foram encontradas. No mesmo dia, uma mortandade de peixes começava na lagoa de Marapendi, considerada a de melhor qualidade.
""Esse cenário apocalíptico foi construído pelo descaso das autoridades e da população. A cidade foi crescendo, e o problema não foi enfrentado. As principais causas são o esgoto lançado por ricos e pobres nas lagoas, a ocupação irregular do solo e o desmatamento", afirmou Moscatelli.
Quase todos os condomínios da Barra têm estações de tratamento do esgoto, o que pouco adianta. ""As estações só reduzem a demanda biológica de oxigênio, mas vírus, protozoário, nitrogênio e fósforo são jogados na água das lagoas do mesmo jeito", disse.
Além dos problemas para a saúde dos esquiadores, a bacia hidrográfica de Jacarepaguá poderá criar constrangimento aos organizadores do Pan de 2007. O canal do Arroio Fundo passa atrás da Vila do Pan, condomínio que abrigará os atletas. O canal é um dos mais poluídos da bacia. Ele drena grande parte do esgoto de Jacarepaguá. O nível de oxigênio lá é quase zero 24 horas por dia.
""Devido à overdose de esgoto, temos liberação de gás sulfídrico e metano em várias lagoas e aqui principalmente. Esses gases são uma outra forma de decompor a matéria orgânica. Se tivermos uma ressaca no mar durante o Pan, a água vai remexer o fundo, e o cheiro de ovo podre vai subir, acabando com a paz dos atletas", disse Moscatelli, que vê no evento das Américas "a última chance de recuperação das lagoas".
""Este não é um cartão-postal que queremos passar. Por isso, todos os governos têm que parar de brigar entre si e encontrar um caminho para recuperar as lagoas", finalizou o biólogo.

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