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São Paulo, sábado, 31 de maio de 2003

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FUTEBOL

A graça e a desgraça do frango

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Um frango colocou o Santos na semifinal da Libertadores, outro frango tirou o Grêmio do torneio.
O primeiro foi engolido pelo goleiro Perez, do Cruz Azul; o segundo, pelo controvertido Danrlei, que em tantas noites mais memoráveis fechou o gol gremista. E parece que o arqueiro do River Plate, Buljubasich, também ficou com as penas nas mãos pelo menos duas vezes na partida contra o América de Cali.
A ironia é que, na mesma semana em que a América Latina presenciou falhas catastróficas, a Europa se curvou diante da competência de um goleiro brasileiro, Dida, que pegou três pênaltis na final da Copa dos Campeões.
São os dois extremos em que o goleiro, normalmente um ser quase tão anônimo quanto as traves, vira manchete de jornal: quando defende pênalti ou quando toma frango.
"A poesia do futebol está no frango", dizia Nelson Rodrigues, referindo-se certamente ao que há de inesperado, cômico e trágico nessa falha capital. O frango inverte as expectativas, sacode a modorra, desperta o torcedor para a carga dramática do jogo.
Mas há frangos e frangos. Nem todos são iguais. Talvez seja possível classificá-los de acordo com uma tipologia.
Por falta de espaço e de competência, não vou nem tentar. Só chamo a atenção para os dois tipos básicos de frango: o "técnico" e o "psicológico".
O frango que chamo de técnico é aquele que advém de uma falha de colocação, de um cálculo mal feito da trajetória ou da força da bola, de um golpe defeituoso de mão (um tapa muito fraco, por exemplo) ou de pé (uma furada), de um salto atrasado etc.
Foi o caso, por exemplo, de Danrlei, no jogo de anteontem. Ou de Marcos, defendendo o Palmeiras na final do Mundial interclubes de 99. Calculou mal a trajetória da bola num cruzamento e só foi encontrá-la dentro do gol.
Já o frango "psicológico" é causado exclusivamente pelo estado mental do goleiro. Se ele estiver distraído ou demasiado afoito, poderá deixar de prestar atenção no que está fazendo e meter os pés pelas mãos (ou vice-versa).
Um exemplo clássico é o de Waldir Peres, no primeiro jogo do Brasil na Copa de 82, contra a então União Soviética. A bola veio tão fraquinha que, ao se ajoelhar para apará-la, ele já estava pensando no que fazer em seguida (Sair jogando com um lateral? Dar um chutão para o meio-de-campo? Lançar com as mãos?).
Com a mente voltada para o futuro, Waldir não deu a devida atenção ao gesto prosaico de encaixar a bola junto ao peito, submetê-la, acabar com a vida que ainda vibrava nela, antes de fazê-la ressuscitar e voltar ao jogo sem perigo. Quando se deu conta, a maligna estava dentro do gol.
As câmeras mostraram por todos os ângulos a desolação de Waldir Peres. A fragilidade de um homem diante do destino insondável: foi essa a poesia do futebol que milhões de pessoas pelo mundo afora presenciaram naquele instante.

Clássico desfalcado
Os desfalques do São Paulo (Ricardinho, Kaká, Leonardo, Souza e Fabiano) não apenas desfiguram o time, mas também tiram muito da graça do clássico de amanhã, contra o Santos. De todo modo, motivação não deve faltar, pois, sem falar da rivalidade tradicional, os dois times estão em luta direta pelas primeiras colocações no Brasileirão.

Rodada quente
Outros jogos cruciais da rodada devem ser Fluminense x Atlético-PR e Vasco x Atlético-MG. O Furacão, que vem de uma bela goleada sobre o Flamengo, tentará repetir a façanha contra o abalado Flu, que perdeu de 3 a 0 para o Atlético-MG. O Galo, por sua vez, procura voltar ao topo da tabela, enquanto o Vasco tenta manter as esperanças.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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