São Paulo, domingo, 31 de outubro de 2004

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POR UM FIO

Atirador paraplégico colocou duas pontes de safena e já voltou ao esporte e ao trabalho

Exames salvaram infartado sem dor

DA REPORTAGEM LOCAL

Cillas Marci Viana, 46, já subiu morros, invadiu mansões e não sabe o que é mais perigoso. Já sobreviveu a um ataque de granadas e a um tiro à queima-roupa, que o deixou paraplégico. Diz não temer a morte. Mas, quando esteve diante dela, não foi por causa de suas atividades como policial. Cil-las vestia um agasalho de atleta.
Sargento da PM, carioca, membro da equipe paraolímpica de tiro, ele é o exemplo extremo de como os exames periódicos podem salvar a vida de esportistas. "Não sentia nada. Só uma queda de pressão um pouco antes. Não imaginava, não tinha a mínima idéia do que estava acontecendo."
Para contar sua história, Cillas retorna a agosto do ano passado.
Ele havia acabado de voltar da Holanda, onde conquistara o bronze por equipes em um torneio, e viajou a Recife para uma série de exames de rotina do CPB (Comitê Paraolímpico Brasileiro).
"Uma das etapas é fazer um eletrocardiograma seguido por uma prova de esforço. Logo no exame achamos características de infarto", diz o médico Marcelo Leitão.
Os médicos mergulharam no caso e pediram um ecocardiograma, espécie de ultrassom que mostra as estruturas cardíacas, e descobriram que Cillas havia sido vítima de um "infarto silencioso", sem dor. Começou, então, uma investigação para descobrir o motivo para isso. A primeira hipótese, diabetes, foi logo eliminada. Só após queimarem outras possibilidades os profissionais que atenderam Cillas mataram a charada.
"Quando ele tomou o tiro que o deixou paraplégico, houve uma lesão no nervo vago, que é o responsável por levar ao cérebro as informações sensitivas do coração. Ou seja, ele sofreu um infarto e não sentiu dor. Ainda bem que descobrimos isso antes do teste de esforço", conta o médico do CPB.
Dois meses e várias baterias de exames depois, Cillas foi submetido a uma cirurgia para implantação de duas pontes de safena. Hoje, um ano após a operação, já voltou a trabalhar no sistema de monitoramento de câmeras de vídeo da PM do Rio e a praticar tiro, na modalidade pistola olímpica.
"Não tive alternativa. Fiz a cirurgia e acabou. Hoje faço minhas competições num ritmo mais leve e larguei de vez a carne vermelha."
Segundo ele, o susto, pelo inesperado da situação, foi maior do que no tiroteio que o colocou numa cadeira de rodas, em 1992, após assalto a um Banco do Brasil em Duque de Caxias (Baixada Fluminense). Durante a perseguição, os bandidos chegaram a jogar granadas contra o carro da PM.
"Conseguimos desviar e depois, no tiroteio, acertei um tiro de [calibre] 12 no marginal, que caiu no mato. Eu tinha certeza de que ele estava estrebuchando, mas, quando cheguei perto, ele deu o último suspiro e atirou em mim. Acertou minha segunda vértebra."
"Não vi arma, não vi nada. Ele tirou a mão do mato e atirou. Depois, morreu. E eu, que nunca tive medo da morte, fiquei então com medo de dar trabalho às pessoas. Ainda bem que sei me virar sozinho. E acho também que tudo isso serviu para me deixar mais durão para aquela coisa do infarto."
A história de Cillas deve ser publicada pelos médicos que o atenderam. "O caso é interessantíssimo. Vamos publicar esse relato em breve", promete Leitão.(FSX)

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