São Paulo, segunda-feira, 02 de fevereiro de 2004

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MÚSICA

Tucaemell usam o hip hop como arma para a inclusão social

Em busca da batida perfeita

MARCOS DÁVILA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Sabe o White Stripes, né? Aquela banda de rock de Detroit (EUA) com a estranha formação de bateria e guitarra. Imagine agora um White Stripes com duas Megs na bateria, só que com o mesmo peso e desenvoltura de Jack, o guitarrista. Assim, dá para ter uma idéia da dupla Tucaemell, uma máquina de grooves que vem demarcando seu espaço na cena do hip hop brasileiro.
Formado em março de 2002, pelas bateristas e percussionistas Ursula "Tuca" Pedrosa Milan, 25, e Melissa "Mell" Pazzanese, 24, o duo se apresenta em campeonatos de break nas periferias de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Curitiba.
Em dezembro do ano passado, as meninas fizeram um pocket-show na festa do evento de cultura hip hop Agosto Negro, organizado pela Prefeitura de São Paulo. Foram 20 minutos ininterruptos de quebradeira total, enquanto os b.boys abriam a roda na pista.
Mell é canhota, e Tuca, destra. Então, as duas ficam lado a lado em suas baterias, como se fossem uma pessoa só. "A gente vira a mulher polvo", brinca o lado direito do duo.
Na platéia, entre os muitos marmanjos embasbacados com as duas pequenas, que não deixavam beat sobre beat, estava o rapper Xis, igualmente impressionado. Na mesma noite, o rapper, que não é bobo nem nada, convidou as duas para tocar com ele no show no vale do Anhangabaú, em comemoração aos 450 anos de São Paulo, quando as duas se apresentaram para um público de mais de 50 mil pessoas.
As paulistanas Tuca e Mell estudaram juntas no colégio e, depois de um tempo de afastamento, se reencontraram numa oficina de percussão dada pelo mestre Airto Moreira.

Levantamento de rua
Um dia, da janela do carro, Mell viu o menino de rua João (nome fictício), 15, dançar break pela primeira vez, com os amigos. "Falei para a Tuca: "a gente tem de tocar com eles", lembra Mell. Depois de alguns dias, ela já estava com a parceira na rua com os garotos. Munidas apenas de caixa e de surdo, elas começaram ali mesmo um trabalho que mais tarde se transformou no grupo de b. boys Levantamento de Rua.
"É um incentivo para levantar na vida, sair das ruas. Agora, eu tenho responsabilidade. Antes, eu só queria fazer coisas que eu sei que são erradas. Quero voltar para casa, voltar a estudar, fazer tudo que eu tenho direito", diz João, o b. boy pioneiro.
A equipe é formada por oito garotos de rua. "Eles têm casa e mãe, mas ficam mesmo é na rua", afirma Mell. O envolvimento foi tão grande que ela resolveu ir morar também na favela, para ficar mais próxima da comunidade. Os ensaios aconteciam na rua, na casa de Mell e às vezes na USP. Depois de um mês, o Levantamento de Rua estreou uma coreografia no projeto Engenho Teatral, realizado no Campo Limpo (na periferia de São Paulo). O grupo continua crescendo e já participou de um clipe do rapper Marcelo D2.
As garotas, no entanto, sabem que não é só de música que eles precisam e se esforçam para marcar reuniões com psicólogos e com educadores, além de contar com a ajuda de mais duas voluntárias.
"Queremos montar uma sede. É muito difícil trabalhar desse jeito, sem dinheiro nenhum. Estamos procurando algumas parcerias com ONGs, mas pretendemos em breve fazer a nossa própria organização", diz Mell. Interessou? E-mail nelas: tucaemell@yahoo.com.br.
"Todo mundo pensa que duas mulheres tocando batera não vai dar certo. Mas chega a hora, e fica todo mundo, assim, de boca aberta", afirma o garoto. Quer saber? Tucaemell está nas ruas. E o White Stripes, onde está mesmo?



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