São Paulo, Segunda-feira, 10 de Julho de 2000
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Esporte e música são as diversões da galera

DA REPORTAGEM LOCAL

O motoboy Ricardo Fernandes, 21, detesta quando falam mal do Jardim Ângela, onde vive desde que nasceu. "Quem mora aqui vê mesmo um monte de tretas, mortes, neguinho se drogando. Mas isso não é coisa só do Ângela, rola em qualquer lado da periferia", diz.
Para não se meter em confusão, ele tem uma receita simples: "É só não se meter com má companhia que não tem erro".
Quando não está trabalhando, Ricardo se encontra com os amigos para empinar pipa ou jogar basquete na quadra que fica no Jardim Planalto.
"Aqui, se não fosse o esporte e a música, a gente não teria nada para fazer", diz Milton Patrício da Paixão, 20. Aspirante a pagodeiro, Milton frequenta o curso de DJs da paróquia Santos Mártires. "Ainda quero ser famoso e poder ganhar a vida tocando pagode", sonha o rapaz, que toca violão no grupo que formou junto com alguns colegas, o Fria Lição.
Como a maioria dos amigos, Milton está desempregado. "Já trabalhei como office-boy. Mas agora achar emprego está quase impossível", diz. O último dinheiro que conseguiu foi um cachê de R$ 150 por uma apresentação de seu grupo de pagode numa quermesse no Ângela. "Mas tivemos de dividir a grana entre os sete integrantes." Quando não está ensaiando com o grupo, Milton passa o tempo jogando futebol.
Cristina Barbosa, 20, colega de Milton no curso de DJs, bolou um método para poder sair de casa à noite sem ser incomodada por ladrões nem traficantes: "Saio de casa com minhas amigas às 22h, e só voltamos depois que o dia amanhece, lá pelas seis da manhã". Mas e se der sono antes disso? "O jeito é dormir na casa de alguém. Voltar para casa no meio da madrugada, nem pensar", diz.
A garota fica indignada com a audácia de alguns traficantes da região. "Tem uma viela perto da minha casa que, se você quiser atravessar, tem de dizer uma senha para quem estiver tomando conta. É o fim da picada."
Os pais do estudante Almir de Oliveira, 18, estão tão assustados com a violência do bairro que mal deixam o garoto sair de casa à noite. "Só posso ir até a igreja, onde faço aula de catequese, e tenho de voltar direto para a casa", conta. A nóia dos pais se justifica. "Um cara deu um tiro na cabeça do meu cachorro no quintal de casa. Só fez isso porque estava doidão. No dia seguinte, ele veio pedir desculpas a minha mãe, e ela teve de aceitar para não ter problemas depois." (CA)


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