São Paulo, Segunda-feira, 11 de Outubro de 1999
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Respeito ao público anda em falta no Brasil

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
Colunista da Folha

Bagunça e revolta dos fãs antecederam a apresentação da banda americana Red Hot Chili Peppers em São Paulo, anunciada para sexta-feira que passou.
O motivo foi o de sempre: uma monumental lambança na venda do ingresso mais barato, a tal meia-entrada.
Por muitos anos, bastava o estudante brasileiro apresentar a carteirinha da escola para ganhar descontos bacanas em shows, cinemas, teatros etc. Um dia isso acabou, para voltar, mais recentemente, em forma de burocracia e monopólio. Agora, é preciso ter a carteirinha da União Nacional dos Estudantes, a UNE, controlada desde o paleozóico pelo Partido Comunista do Brasil.
A UNE já teve papel de destaque no cenário político nacional, principalmente durante os primeiros anos do regime militar. Depois, o movimento estudantil foi massacrado pelos governantes de farda e reconstruído, com muita coragem, na segunda metade dos anos 70.
O terrível é que, de certa forma, o governo autoritário conseguiu o que queria: há muito tempo a UNE não representa mais ninguém, exceto as tendências políticas que eventualmente estejam no poder.
Na minha época (e imagino que continue assim), os congressos da UNE, da União Estadual dos Estudantes (UEE) e outras entidades eram marcados por batalhas verbais de alta temperatura. Oradores, em geral brilhantes, gastavam horas tentando convencer os delegados com direito a voto.
Só que não precisava. A maioria esmagadora dos delegados tinha vínculos com tendências. Por melhores que fossem os argumentos concorrentes, ninguém mudava de idéia. Todo mundo sabia, desde o começo, no que iria votar.
Sempre achei que seria muito mais fácil, já no começo do congresso, contar quantos delegados eram do PC do B, quantos do PCB, da Caminhando, da Libelu, da Convergência Socialista etc. O tempo de discussão seria abreviado, e todo mundo iria para casa mais cedo.
Conto essa história toda para chegar ao melancólico estado da UNE hoje: mera atravessadora de ingressos, que não consegue ser competente nem mesmo nessa mísera e última atribuição que lhe restou.
Ainda falando de respeito ao público, os quatro americanos da banda Man or Astro-man?, que tocou em São Paulo na semana passada, deram seguidos exemplos de profissionalismo, gentileza e infinita paciência.
Trouxeram um técnico de som que também quebra o galho como roadie. E só. Eles mesmos montam e desmontam equipamento, afinam guitarras, plugam a parafernália toda.
No show de terça-feira passada, suportaram com bom humor o comportamento bestial de parte da platéia. Continuaram tocando mesmo depois que um dos guitarristas teve de abandonar o palco, com um corte profundo no supercílio. E, depois da apresentação, ainda perderam horas conversando com a galera, dando entrevistas para fanzines etc.
Exemplo legal, principalmente no Brasil, país das estrelas de brilho fraco e pompa de sobra.
Interessante os Titãs lançarem agora um disco de covers, depois de dois álbuns de músicas antigas em versões acústicas.
Ao que parece, a pergunta importante ainda não foi feita a nenhum Titã, a saber: "Você poderia dar uma palhinha de uma música nova, que vocês tenham feito há pouco tempo?". Ou ainda, para ser mais direto: "Há quanto tempo vocês estão sem compor?".


Álvaro Pereira Júnior, 36, é chefe de Redação do "Fantástico" em São Paulo. E-mail: cby2k@uol.com.br

cd player
"Something About Airplanes", Death Cab for Cutie
Não se sinta ignorante por nunca ter ouvido falar dos ótimos Death Cab for Cutie. Ultra-independentes, fazem um folk melancólico e incontrolavelmente moderno.
"Premiers Symptomes", Air
Dica do Paulo César Martin, que apresenta o programa ""Garagem", na Brasil 2000 FM (107,3 MHz). Registros do começo de carreira desses franceses hoje consagrados. São sete faixas, e só uma legal: "Californie".
Farofa Carioca
Um amigo informa: seu Jorge, líder da Farofa Carioca, puxou o carro, e a banda acabou. Mas como? Eles não eram o máximo? Não iam deixar marcas indeléveis na história da MPB? Não eram modernos para caramba? Como pode?

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