São Paulo, segunda-feira, 22 de março de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

folhateen explica

Virada eleitoral pode modificar rumo da luta contra o terrorismo

Mentira sobre atentado derrota o governo da Espanha

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

A Espanha é um país que costuma dar boas lições ao mundo. Deu novamente algumas na semana passada.
A história é relativamente simples. O governo do premiê José María Aznar mentiu. Disse que os terroristas bascos eram os responsáveis pelo atentado nos trens de Madri que matou 201 pessoas no último dia 11 de março.
Mas os atentados foram, em verdade, perpetrados por um grupo de marroquinos ligado à Al Qaeda e ao terrorismo islâmico.
Os espanhóis sabiam como punir o governo pela mentira. No domingo seguinte, haveria eleições legislativas. Como a Espanha é uma monarquia parlamentarista, o partido que fizesse a maioria passaria a governar o país.
O Partido Popular, de Aznar, era o favorito, segundo todas as pesquisas. Se tivesse dado certo, o novo premiê seria Mariano Rajoy, do PP, que é de centro-direita.
Mas deu tudo errado. No sábado, por volta das 20h, o Ministério do Interior precisou dizer que estavam presos cinco suspeitos ligados ao islamismo radical.
Horas depois, às 9h de domingo, os espanhóis começaram a votar. Derrotaram o PP, que perdeu 35 deputados em relação à legislativa de 2000. A eleição foi ganha pelo PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol), que elegeu 39 deputados a mais que há quatro anos, e o novo premiê será o dirigente desse partido, José Luis Rodríguez Zapatero.
O PSOE é hoje um partido social-democrata. Não quer mais a revolução socialista que pregava ao ser criado, em 1879. Foi o mais forte partido espanhol durante a República (1931-1939), sobretudo em seus quatro últimos anos, marcados pela Guerra Civil, na qual ele e a esquerda foram derrotados. Saiu da clandestinidade em 1977 e governou, com o premiê Felipe González (1982-1996).
A moral da história não é apenas eleitoral e nem essencialmente espanhola. Aznar aderiu, no ano passado, à idéia de George W. Bush de invadir o Iraque para neutralizar os arsenais químicos e bacteriológicos que poderiam cair em mãos de terroristas.
Acontece que esses arsenais não foram encontrados. E, ainda por cima, a presença militar dos EUA no Iraque acirrou as tensões no mundo islâmico, o que indiretamente favoreceu a causa do terrorismo.
Aznar não quis discutir o Iraque durante a campanha eleitoral. Ele e seu partido foram, no fundo, as primeiras vítimas ocidentais da guerra de Bush. O próprio Bush, com eleições presidenciais neste ano, e seus aliados -Tony Blair, no Reino Unido, ou Silvio Berlusconi, na Itália- têm, a partir de agora, motivos de sobra para se preocupar.


Texto Anterior: Game On: O lado obscuro (e pra lá de charmoso) da força
Próximo Texto: Estante: Velhos e bons poemas de amor
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.