São Paulo, segunda-feira, 22 de novembro de 2004

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MANIA

Para ajudar nos exames de final de ano, adolescentes usam de pedras do signo a dado de RPG como talismã

Amuletos á toda prova

Flávio Florido/Folha Imagem
O estudante João Moraes, 17, que faz teatro há dez anos, com o amuleto que ganhou da mãe em uma estréia


ALESSANDRA KORMANN
DA REPORTAGEM LOCAL

Pé de coelho e figa de guiné são coisa do passado. O negócio agora é pedra do signo, miniatura de sapo, cueca da sorte e o que mais a imaginação sugerir. Para tirar boas notas nas provas de final de ano, vale até usar dado de RPG ou camisa de time de futebol como patuá, segundo os adolescentes entrevistados pelo Folhateen.
As amigas Rayra, Jady, Marina e Andressa, da 6ª série do colégio Albert Sabin, em São Paulo, costumam colocar objetos místicos em cima da mesa na hora da prova.
Rayra Carvalho Maia, 13, leva todo dia para a escola uma pequena caixa de madeira com três pedras do seu signo (Virgem). "Eu fico mais confiante. Na prova de português, eu esqueci a caixinha em casa e tirei 6,5. Nas outras, tirei 9", conta.
Jady Alexia de Andrade Vidal, 12, e Marina Minassian Ramos, 12, andam sempre com um sapinho japonês ("kaeru"). "Ontem eu esqueci o sapinho em casa e fiquei meio nervosa porque eu ia receber a prova de redação. Mas, como eu estava com o meu colar da sorte, deu tudo certo e tirei uma nota alta", diz Marina. Ela também tinha um "tênis da sorte", mas ele ficou pequeno e não serve mais.
Já Andressa Ferreira Thomé, 13, faz um verdadeiro ritual quando vai estudar em casa: acende incensos e coloca uma lua azul em cima da mesa. Ela também usa sempre pingentes de cristal. "Sei que o amuleto não vai fazer o serviço para mim, só vai me dar a base para eu me sentir mais segura."
Bruno Rebuci Sá, 13, da 7ª série do colégio Anchieta, em São Bernardo (SP), usa um dado de dez lados de um jogo de RPG para ter sorte no colégio. "Antes de começarem as provas, eu jogo o dado até sair o número dez, aí me sinto melhor. As minhas notas melhoraram depois que comecei a fazer isso. Em espanhol, tirei 7. Antes eu tirava 5,5, por aí. Foi um avanço para mim."
Gabriel Luis Buratin, 18, que mora em Santo André, atribui o seu bom desempenho na escola a uma cueca verde. "Eu ligo muito uma coisa a outra. Consegui notas muito boas em alguns exames e aí percebi que estava com a mesma cueca nesses dias", explica. "Na semana de prova, eu vejo quais são as matérias mais difíceis para vestir a cueca. Por questão de higiene, não dá para usar durante a semana inteira."
O estudante Daniel Simioni Balsa, 20, apela para a sua coleção de camisas de time de futebol. Torcedor do São Paulo, veste a camisa do Paris Saint-Germain para fazer provas. "Há alguns anos, eu fiquei de recuperação e tinha quase certeza de que ia repetir de ano, mas a camisa me salvou."
Ele desenvolveu todo um repertório temático: para apresentar um trabalho sobre o presidente argentino Juan Domingo Perón (1895-1974), vestiu a camisa da seleção argentina; para falar sobre o ditador Adolf Hitler (1889-1945), usou a camisa da seleção alemã. Para o próximo trabalho, sobre a história da música negra no Brasil, já está preparando o figurino. "Como vou ter que falar sobre o passado, vou vestir uma camisa antiga da seleção brasileira, usada na comemoração dos cem anos da Fifa."
Ele também acredita que suas camisas do São Paulo têm o poder de ajudar o time. "Antes de eu ter as camisas, o meu time passou por uma fase ruim. Depois, quando comprei as camisas, melhorou."
Nos dias de jogo, Daniel veste a camisa de acordo com a cor do uniforme usado pelo time. Mas ele tem que colocar a roupa 15 minutos antes do jogo. "Se coloco de manhã, acho que dá azar."

Mil e uma utilidades
Muitos jovens utilizam objetos para canalizar bons fluidos para outras áreas, além da escola. O estudante Diogo Santos Batista Ibaracho, 19, por exemplo, guarda o bico do pneu da sua primeira bicicleta, que ficou na Bahia quando ele se mudou para São Paulo, há seis anos. "Eu demorei a ganhar a primeira bicicleta. Quando ela chegou, era a mais bonita de todas. Um dia, o pneu furou e acabei guardando o bico. Sempre que estou com ele, acontecem coisas interessantes. Uma pessoa que não fala comigo há tempos vem falar, por exemplo. Se eu vou praticar esporte, sempre coloco ele no bolso. Não é que eu me sinta mal sem o bico, mas eu me sinto melhor com ele."
Já para a estudante Patrícia Custódio, 19, o seu amuleto, um anel de prata com detalhe em ouro que ela ganhou do pai, é essencial, especialmente na área sentimental. "Ele é tão velho que não tenho mais coragem de usar, mas vai comigo aonde eu for, dentro da bolsa. Se eu for encontrar um cara, tenho que levar, senão não dá certo."
Patrícia diz que até já testou o poder do anel. "Fiquei sem ele e meu namoro começou a dar errado. Coloquei o anel e voltou a ficar tudo lindo. Depois fiz o teste de novo e aconteceu a mesma coisa. Agora não quero mais arriscar." Ela diz que seria capaz de voltar para casa para buscar o anel se esquecesse de levá-lo em um encontro.
Não é o caso de João Moraes, 17, que faz teatro há dez anos e sempre entra em cena com uma pequena estrelinha que ganhou da mãe no dia de uma estréia.
"Uma vez eu esqueci do amuleto e fiquei um pouco inseguro na hora, mas deu tudo certo. Enfrentar o nervosismo é parte do trabalho do ator. Mesmo se estiver com a roupa errada, com borboletas no estômago ou esquecer uma fala, a gente tem que entrar em cena."
Mas o pequeno objeto o deixa mais confortável. "Eu ia ficar mal se perdesse a estrelinha, porque mostra como minha mãe me deseja boa sorte. Se um dia precisar de sorte em qualquer área, vou apelar para ele."

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