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MÚSICA
Ainda sem data para sair aqui, novo CD de Morrissey traz o ex-líder dos Smiths mais iluminado
Admirável torturador
Ethan Miller/Reuters - 17.abr.04
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Morrissey em Las Vegas, na turnê do seu disco anterior, "You Are the Quarry" |
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
As letras ainda são o melhor travesseiro para quem acha que o mundo é um lugar hostil e injusto. Até
aí, nada de novo. Tampouco é novidade o
fato de que Morrissey, ex-líder dos Smiths,
é um mestre nesse assunto. Só que o novo
CD do artista, "Ringleader of the Tormentors" ("o líder dos torturadores"), que acaba de ser lançado na Europa mas ainda não
tem previsão para sair por aqui, surpreende até os seus fãs mais devotos.
Gravado em Roma, onde o cantor mora
há pouco mais de um ano, parece contaminado pela "dolce vita" italiana. Aqui, Morrissey fala abertamente de sexo, como nunca falou. O tradicional romantismo continua, mas agora parece correspondido. Para
completar, uma produção criativa e épica
dá arranjos e musicalidade à altura de sua
verve, algo que nem sempre acontecia em
seus discos solo anteriores.
Morrissey é raridade no rock. Leu muito
na vida e faz letras ambíguas. Já no novo
CD, ele defende que sua castidade é coisa
do passado. Os pronomes são reveladores
de que o cantor não precisa mais esconder
sua homossexualidade. Apaixonado, ele
canta em "To Me You Are a Work of Art":
"Para mim, você é uma obra de arte/ e te
entrego meu coração, se é que tenho um".
Isso não quer dizer que Morrissey tenha
capitulado à geração Paris Hilton, de celebridades que são famosas sem jamais terem feito uma coisa útil na vida. Parte do
charme e da vigência do artista, que completa 47 anos no mês que vem, vem do seu
mistério. Um divo enigmático, solitário,
que dá poucas entrevistas e, quando o faz,
embaralha ainda mais os fãs -como os artistas de antigamente, que exercitavam
nossa imaginação com dúvidas.
Apesar de mais luminoso que o habitual,
Morrissey continua oferecendo canções
"torturadas" para quem está sofrendo sozinho em seu quarto. "Life Is a Pigsty" ("a vida é um chiqueiro") traz o cantor naquele
momento de sofrimento agudo do qual os
fãs tanto gostam -não à toa, ele costuma
ser agarrado no palco pelos mais exaltados
que o abraçam, na linha: "Eu te entendo".
A roqueira "The Youngest Was the Most
Loved" é firme candidata a animar muitas
festas de quem gosta de se vestir de preto. E
vai agradar até aos mais saudosistas fãs dos
Smiths. O cérebro da banda mais influente
dos últimos 25 anos e que marcou os anos
80 está em sua melhor forma. Como torturadores ou torturados, queremos continuar subjugados a ele por muito tempo.
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