São Paulo, segunda-feira, 27 de outubro de 2008

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02 NEURÔNIO

>> Jô Hallack >>Nina Lemos >> Raq Affonso

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Em defesa da cólica

A GENTE APRENDE no colégio que existem diferenças entre homens e mulheres. Por exemplo, mulheres têm útero. Homens não. E quem tem útero sangra. Por isso é que mulheres têm cólicas menstruais. Homens não. Recentemente, assistíamos a um programa jornalístico da noite de domingo e.... entre a abordagem sensacionalista sobre a morte da menina seqüestrada e um quadro animal-lúdico sobre a vida dos tigres, vimos uma certa reportagem. Era uma pesquisa sobre as cólicas femininas e, segundo os médicos pesquisadores, elas eram ruins, pois afetavam a produtividade das funcionárias. Isso mesmo, a produtividade. Não a funcionária!
Para ilustrar a reportagem, eram mostrados três exemplos. Em um, numa firma de telemarketing, mulheres enfileiradas eram submetidas à estressante rotina de telefonemas. A gerente coordenadora dizia que o problema da cólica foi resolvido com remédios e palestras. E que a produtividade aumentou!
Na outra, uma fábrica de biquínis que funcionava num galpão, o chefe dizia que inventou um método inovador. As mulheres que não reclamavam na cólica participavam de um sorteio quinzenal de brindes. E o resultado é que elas, mesmo com cólica, fingiam que nada sentiam para poderem ganhar os tais brindes.
No último, a caixa de supermercado contava que, quando estava com cólica, fazia a única coisa possível: cantava um samba. São mulheres que, obviamente, são exploradas, trabalham em troca de um salário de fome para que o mundo possa rodar. Nos sentimos no século 19. Deu vontade de queimar sutiãs.
Vivemos em tempos neoliberais em que assistimos ao mundo afundar em uma crise por causa de negociatas e do capitalismo selvagem. Mas parece que o problema da economia é outro: a cólica feminina. Nas entrelinhas de tais pesquisas e reportagens, parece que chegamos a ouvir: "Ei, mulher, não era você que queria ser tratada com igualdade? Pois então, não venha estragar nossa produtividade".
Essa é uma carta aberta em defesa da cólica, pois somos mulheres que sangram. Nosso úteros se contraem, sentimos dor, e vivam com isso. E mesmo as que não sentem dor são solidárias com as outras. Como somos solidárias com os homens, quando eles têm alguma doença "grave", tipo uma gripe. Afinal, senhores pesquisadores, é graças aos úteros que vocês existem.

Momento de histeria

Úteros em fúria!!!!


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