São Paulo, segunda-feira, 31 de maio de 2004

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LIVROS

Editoras apostam em escritores jovens e suas aventuras sexuais para causar polêmica e movimentar vendas

Através do espelho

SYLVIA COLOMBO
EDITORA DO FOLHATEEN

Quando as avós italianas recomendavam a suas netas que escovassem o cabelo cem vezes antes de irem dormir, acreditavam que, assim, elas ficariam mais bonitas, como as princesas dos livros de história. A italiana Melissa Panarello, 18, entretanto, sempre identificou esse gesto como uma espécie de busca pela pureza.
Por isso, quando publicou um diário em que contava suas aventuras sexuais do período em que tinha apenas 16 anos, escolheu como título "Cem Escovadas Antes de Ir para a Cama".
"É um gesto que me remete ao mundo dos contos de fadas e da inocência. Eu também queria um título que fosse misterioso e que não desse dicas sobre o que o livro contém", disse Melissa ao Folhateen .
E o que o livro contém está causando susto e escândalo em várias línguas e sotaques. Já traduzido para 18 idiomas -ao Brasil chega em julho, pela Objetiva-, o diário mistura relatos de experiências sexuais diversas (sexo em grupo, lesbianismo, voyeurismo e outras) com reflexões típicas de uma garota da idade dela. O corpo, a solidão, o medo e a vontade de amar e as notas em matemática surgem entre suas preocupações constantes.
Depois de ter o coração partido pelo namorado, ela passa a procurar amantes na internet e a vagar pelas ruas da cidade de Catania, na Sicília, onde mora, a bordo de sua scooter. Os destinos vão de encontros às cegas a festas fechadas de sexo. Depois de cada uma de suas experiências, entretanto, acaba concluindo que só o que quer é amar e ser amada.
O livro dessa "lolita" já vendeu mais de um milhão de cópias só na Itália e é parte de um fenômeno recente, que tem despejado nas livrarias vários títulos de conteúdo "quente", escritos por gente muito jovem.
Algo parecido já havia acontecido nos anos 80, quando Bret Easton Ellis lançou livros cheios de sexo e drogas -"Abaixo de Zero" foi publicado quando ele tinha 21 anos-, que retratavam aquela geração.
Os autores de hoje não parecem interessados em buscar uma identidade coletiva, mas é certo que estão alimentando uma imensa avidez do mercado por temas desse tipo.
De certa maneira, esses livros pegam carona em outro sucesso de vendas, "A Vida Sexual de Catherine M.", da francesa Catherine Millet. Lançado em 2001, a obra logo atingiu a marca de 2 milhões de cópias vendidas.
Os exemplos se multiplicam. Nos últimos meses, pelo menos três títulos do gênero foram lançados no Brasil. "Hell-Paris 75016" (ed. Intrínseca), da francesa Lolita Pille, 21, com um enredo carregado também de elogios ao consumismo, "Doze" (Geração), de Nick McDonell, 17, que narra aventuras dos adolescentes niilistas ricos de Nova York, e "Política" (Companhia das Letras), do mais velho, mas não menos barulhento, Adam Thirlwell, 25, que fala de sexo a três.
Por onde são lançados, esses livros têm causado intenso burburinho, quando não protestos inflamados. Nenhum deles, entretanto, provocou -pelo menos não até agora- a reação que, na China, teve "Shangai Baby" (ed. Globo), da jovem Wei Hui, em 2002. Sua autobiografia sexual foi proibida pelo governo chinês, e 40 mil exemplares do romance foram queimados em praça pública.
Um dos lançamentos mais interessantes é "Generation S.L.U.T." (MTV Books), de Marty Beckerman, 21, inédito no Brasil. "Slut" quer dizer "puta" em inglês, e, como sigla (S.L.U.T.), significa "adolescentes urbanos sexualmente liberados". No livro, Beckerman mescla ficção, autobiografia, entrevistas com jovens e estatísticas para radiografar o comportamento sexual da juventude americana hoje.


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