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      São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 2003
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VALE A PENA SABER

MATEMÁTICA

Cuidado com a linguagem pode evitar paradoxos

JOSÉ LUIZ PASTORE MELLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Você já deve ter visto em algum muro um cartaz colado com os dizeres: "Proibido colar cartaz neste muro". Do ponto de vista lógico, essa situação caracteriza um paradoxo, já que o próprio cartaz "está colado" no muro.
O descuido na linguagem do dia-a-dia constitui um fecundo ambiente para a investigação de paradoxos lógicos, como veremos por meio de outro exemplo.
Durante a Segunda Guerra Mundial, a companhia sueca de radiodifusão divulgou o seguinte comunicado aos ouvintes: "Em um dos próximos sete dias, a contar de hoje, será realizado um exercício simulado de ação das unidades de defesa civil. Para termos certeza de que nossas unidades de defesa estão alertas a qualquer momento, elas não saberão antecipadamente em que dia da semana será realizado o exercício". Imediatamente após a divulgação do anúncio, o matemático Lennart Ekbom afirmou que, do ponto de vista lógico, não haveria um dia possível para a realização do exercício. Você conseguiria identificar um argumento razoável para o alerta dele?
Considere inicialmente que o anúncio tenha sido divulgado em uma segunda-feira e que, portanto, o prazo final para a realização do exercício seja então a segunda-feira seguinte. Certamente ele não aconteceria na segunda-feira seguinte, porque, se fosse esse o caso, ao final do domingo as pessoas já estariam sabendo que o exercício seria na segunda-feira e, portanto, ele não seria surpresa.
Como ele não pode ser na segunda-feira, também não poderá ser no domingo, já que, se fosse esse o caso, as pessoas já saberiam do exercício ao final do sábado. Estando o domingo fora de cogitação, é a vez de concluirmos que também não poderá ser no sábado, porque, nesse caso, as pessoas saberiam do exercício ao final da sexta-feira. Prosseguindo o raciocínio, conclui-se que não existe um dia possível para o exercício.
Apesar do raciocínio de Ekbom ter sugerido na ocasião a descoberta de um novo paradoxo, especialistas de lógica concluíram, tempos depois, que se tratava apenas de uma falácia, já que a dedução usada não poderia ter sido aplicada a uma situação em que uma das partes envolvidas conhece algo que a outra parte desconhece. Então fica o alerta: para não cair em falácia ou paradoxo lógico, é bom estar atento ao uso preciso da linguagem.


José Luiz Pastore Mello é licenciado em matemática e mestrando em educação pela USP.
E-mail: jlpmello@uol.com.br


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