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PORTUGUÊS
"Falar difícil" nem sempre causa boa impressão
THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA
A ânsia de impressionar o interlocutor por meio do uso de palavras raras ou de sentido menos
conhecido pode levar o falante a
cometer certas inadequações ou
impropriedades lingüísticas.
A ilusão da sinonímia perfeita
faz que muitos creiam que a mera
substituição de uma palavra por
outra mediante consulta ao dicionário possa enriquecer um texto.
A verdade, porém, é que os sinônimos nem sempre são permutáveis nos mesmos contextos. Ruptura, quebra, suspensão, cada termo tem sua situação de emprego
razoavelmente bem definida, embora todos tenham um núcleo
significativo comum.
Há quem, para "falar bonito",
lance mão de perífrases e, por
exemplo, diga "última flor do Lácio" para referir-se à "língua portuguesa" ou, ao indagar de uma
moça a sua idade, peça-lhe que diga "quantas primaveras conta".
Outros não resistem a perguntar
onde está o "busílis" quando querem saber onde está o xis da questão. Esse tipo de linguagem, por
desgastado e nada original, cria
uma atmosfera jocosa em torno
daquele que o usa, visto que a artificialidade do discurso denota a
intenção de impressionar -e o
efeito acaba sendo o oposto.
A impropriedade pode surgir
do fenômeno conhecido como hipercorreção. O fonema /i/, muitas
vezes, é considerado uma pronúncia incorreta de /e/. É por isso
que, às vezes, ouvimos "previlégio" no lugar de "privilégio" ou
"eminente" no lugar de "iminente". Neste último caso, as duas palavras coexistem com significados
diferentes. Diz-se, por exemplo,
que um perigo é "iminente" (ou
seja, está prestes a ocorrer). "Eminente" quer dizer "ilustre".
O mesmo ocorre com o fonema
/u/, visto como a forma incorreta
de /o/. Assim, há quem prefira
"comprimentar" os amigos a
"cumprimentá-los". Ora, "cumprimento" é o ato de "cumprir"
ou o de "cumprimentar", mas
"comprimento" é um sinônimo
de "extensão".
Além das confusões favorecidas
pela existência de palavras parecidas na língua portuguesa, há casos de impropriedade semântica
que resultam da distração. É conhecida a história de um político
que, em discurso inflamado, dizia
que a nação estava à beira do abismo e que, ele, se eleito, faria que o
país desse um passo à frente...
Situações como essa não são difíceis de evitar. Basta que não se
compreenda o saber lingüístico
como um feixe de frases feitas e de
construções pomposas de efeito
duvidoso.
Thaís Nicoleti de Camargo é consultora
de língua portuguesa da Folha
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