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GRAMÁTICA
Concordância verbal e suas armadilhas
ODILON SOARES LEME
ESPECIAL PARA A FOLHA
Pessoas que têm bom domínio
da norma culta ficam realmente escandalizadas quando, em entrevistas pelo rádio ou pela televisão, ouvem frases como "Felizmente não houveram conseqüências graves", "Já fazem cinco
anos...", "São por esses motivos
que..." E a estranheza fica ainda
maior quando quem fala é um figurão dos altos escalões...
Não há dúvida de que esses plurais não fazem parte da linguagem informal. E é exatamente por
isso que algumas pessoas, em situações em que se espera o padrão culto, "capricham" em fazer
o verbo concordar com aquilo
que elas imaginam ser o sujeito da
oração.
Ocorre, porém, que o verbo haver, quando significa "existir" ou
"ocorrer", e o verbo fazer, quando indica tempo decorrido, são
impessoais, não têm sujeito e devem, portanto, ficar na terceira
pessoa do singular. O que a norma culta indica é, então, "Felizmente não houve conseqüências
graves" e "Já faz cinco anos..."
Em relação à frase "São por esses motivos que...", a norma culta
indica "É por esses motivos
que...". Por quê?
A expressão é que funciona como expletivo. Trata-se de uma expressão que, embora não necessária à estrutura da frase, dá-lhe
mais força e expressividade. Em
lugar de dizer simplesmente "Esses empresários deveriam ser incentivados", podemos dizer "Esses empresários é que deveriam
ser incentivados". Em vez de
"Precisamos de pessoas assim",
poderíamos ter "De pessoas assim é que precisamos".
Existe a possibilidade de separarmos os elementos do expletivo, colocando o verbo ser no início da oração e flexionando-o para concordar com o elemento que
vem a seguir: "São esses empresários que deveriam ser incentivados", "São pessoas assim que nós
admiramos"...
Mas, cuidado: a flexão do verbo
ser, nesse caso, só pode dar-se se
ele não vier seguido de preposição. Daí o desvio em "São por esses motivos que...". Como depois
do verbo ser temos a preposição
por, a construção adequada é "É
por esses motivos que...".
Em termos de norma culta, a
orientação é que o verbo ser
do expletivo "é que" somente se
flexione, em início de oração,
quando vem seguido de um grupo nominal não preposicionado.
Essa é a razão por que dizemos
"É nessas horas que se conhecem
os amigos".
Odilon Soares Leme é professor do Anglo, responsável pela vinheta "S.O.S. Língua Portuguesa" da rádio Jovem Pan e
autor de "Tirando Dúvidas de Português" e de "Linguagem, Literatura, Redação" (Editora Ática)
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