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      São Paulo, quinta-feira, 22 de maio de 2003
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PORTUGUÊS

Posição do pronome pode alterar sentido da frase

THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A disposição das palavras na frase pode estar a serviço tanto da clareza da expressão como da ênfase. Aparentemente, não há diferença entre as seqüências "olhos verdes" e "verdes olhos", já que ao substantivo "olhos" se apõe um atributo de cor. Mas é certo que a anteposição do adjetivo -por ser menos corriqueira- confere subjetividade à expressão.
O mesmo se pode dizer de certas construções em que a função adjetiva é exercida por pronomes possessivos. Para indicar meramente a posse, o pronome aparece anteposto ao substantivo ("seus discos"), mas, em construções como: "Deus meu!" ou "Filho meu, que fazes?", a posposição do possessivo empresta tom solene à expressão, que ganha ênfase.
A posposição, entretanto, nem sempre confere solenidade à formulação. O professor vaidoso que diz "Aluno meu não tem dúvida nesse assunto" está dizendo que nenhum de seus alunos tem tais dúvidas. Note-se a ausência do artigo antes do substantivo, fundamental para que o sentido genérico seja preservado (afinal, não se trata de um aluno em particular, mas de qualquer um deles). Estrutura semelhante, desta vez com anteposição de artigo indefinido, está presente no conhecido verso do Hino Nacional Brasileiro: "Verás que um filho teu não foge à luta...".
Há casos, porém, em que a mudança de posição do possessivo altera, de fato, o sentido da expressão. Por exemplo: "Minhas lembranças" são aquelas que eu tenho, mas "lembranças minhas" são as que os outros têm de mim. Situação semelhante se dá com o substantivo "fotografia": em "Você viu minhas fotografias?", as fotografias pertencem a mim ou foram tiradas por mim, mas, em "Você viu fotografias minhas?", as fotografias são aquelas em que eu apareço. O mesmo se dá com "receber sua carta"(que pertence a você) e "receber carta sua"(enviada por você -aqui o possessivo designa o alvo de uma ação).
Esse é também o uso que faz Camões na comovente fala de Inês de Castro ("Os Lusíadas", canto 3º), quando os possessivos indicam seres que são alvo de um sentimento: "Mova-te a piedade sua e minha" (entenda-se a piedade das criancinhas e de mim).


Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha. E-mail:
tnicoleti@folhasp.com.br


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