São Paulo, quinta-feira, 01 de março de 2007

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COMIDA

¡Vamos tapear!

Enganar, iludir? Nada disso, "tapear", em espanhol, é o ato de comer tapas, os tira-gostos que ganham nova casa em São Paulo, o Eñe, dos gêmeos catalães Sergio e Javier Torres

JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL

Ir de bar em bar, "picando" pequenos bocados de comida. A divertida tradição "del tapeo", cultura que leva os espanhóis a uma infinidade de bares de tapas na mesma noite, já pode ser reproduzida por aqui. Isso porque a oferta de restaurantes e bares de tapas aumentou consideravelmente em São Paulo nos últimos anos.
As tapas nada mais são que pequenas porções, quentes ou frias, de diferentes alimentos salgados. Na Espanha, costumam ser servidas com Jerez -o vinho fortificado espanhol.
Daqui a duas semanas, os tira-gostos espanhóis ganharão o reforço de uma casa de peso: o Eñe -o restaurante abrirá aos clientes no próximo dia 20.
Tendo à frente os chefs catalães Sergio e Javier Torres, conhecidos como os "gêmeos de ouro" da moderna gastronomia espanhola, o Eñe terá espaço tanto para tapas mais elaboradas quanto para receitas clássicas, como a paella e o fideuá, mas atualizadas. Na carta de vinhos, só rótulos espanhóis.
"A linha da cozinha é a espanhola, com raízes da Catalunha. É um conceito de tapas bastante cuidado", diz à Folha Javier Torres, que divide com o irmão o cargo de chef-consultor -ambos são sócios do ex-executivo Arcadio Martinez.
Por tapas cuidados, entendam-se bocados bem montados que, pela beleza, despertam um temor de levá-los à boca. Mas, na essência, são simples. Podem ser ovinhos de codorna fritos sobre fatias de batata, ou almôndegas adornadas com lula, ou fatias de polvo com alho e louro.
"O importante é que, respeitando os produtos e dando-lhes uma estética, venha-lhe à memória a infância, ou recordações de uma comida", diz Javier Torres. "O mérito do cozinheiro não está em saber manipular uma lagosta com caviar. Eu, como consumidor, quero que me surpreendam com uma batata, com um legume. Às vezes, o simples é o melhor."
O conceito da simplicidade, no entanto, não necessariamente dispensa o uso da tecnologia quando esta pode extrair dos alimentos o que há de melhor neles. O gastrovac, um equipamento criado pelos gêmeos, permite, entre outras coisas, que as comidas sejam cozidas à vácuo, em baixas temperaturas, sem que as fibras sejam rompidas e com realce no sabor. Sucesso na Europa, nos EUA e no Japão, o equipamento, por enquanto, não será usado no Eñe. Mas há a intenção de incorporar depois pratos elaborados com ele.

Tampa de taça
Em meio a várias teorias sobre a origem das tapas, a mais factível é a de que os espanhóis usavam fatias de presunto, de chorizo ou de queijo para tapar as taças de vinho e, assim, protegê-las das moscas.
A idéia das tapas, de comer pouco e de maneira variada, sem necessariamente ter de pedir um prato principal, ainda é nova por aqui, mas não intimida o chef catalão.
"Estou seguro de que os brasileiros vão gostar. Primeiro porque é uma forma de comer muito mais divertida, que não é a de pedir uma entrada, o prato principal e pronto. Te dá mais informação", opina Javier.
A diversidade de tapas do Eñe poderá ser apreciada em um misto de menu-degustação com menu-confiança. Quem fizer essa opção, experimentará, às cegas, oito tapas e duas sobremesas escolhidas pelo chef.

No balcão
Instalado no número 213 da rua Dr. Mario Ferraz (esquina com a rua Artur Ramos, no Jardim Paulistano, tel. 0/xx/11/ 3816-4333), o Eñe dará lugar de honra àquele que na Espanha é o protagonista de qualquer bar de tapas: o balcão. Talvez esteja aí o segundo tabu a ser quebrado no Brasil: embora a maioria das casas de tapas tenham balcão, eles raramente são usados.
"Sou fascinado por balcões. Prefiro o balcão à mesa. O encontro é mais divertido."
É nítida a intenção de que o Eñe, apesar do inevitável requinte da alta gastronomia, seja um lugar mais descontraído, mas o couvert médio não é dos mais baratos, estimado entre R$ 60 e R$ 80 (sem vinho).
A cozinha, toda envidraçada, permitirá ao cliente acompanhar o vai-e-vem à beira do fogão. Se a visão a partir do salão ainda não for suficiente, pode-se optar por sentar numa mesa... dentro da cozinha. A cada noite, quatro pessoas poderão desfrutar essa experiência.
E, dentro ou fora da cozinha, é bom ficar atento a um princípio das tapas: o de usar as mãos para comê-las sempre que possível. "Se vejo alguém comer com talheres, dou minha opinião. Digo: "Perdão, mas pegue o camarão com as mãos e o chupe". O restaurante tem de ser descontraído para que todos se sintam à vontade para comer com as mãos e desfrutem sem a barreira das boas maneiras."


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