São Paulo, sexta-feira, 01 de agosto de 2008

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Artista Athos Bulcão morre aos 90

Ele estava internado no hospital Sarah Kubitschek, em Brasília, e sofreu parada respiratória ontem pela manhã

"Ele fez uma relação da arquitetura com as artes plásticas, mostrando que poderia acontecer de forma inteligente", diz Niemeyer


JOHANNA NUBLAT
SIMONE IGLESIAS

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA O artista plástico Athos Bulcão morreu ontem, menos de um mês após completar 90 anos e a 20 dias de comemorar 50 anos de Brasília, cidade repleta de seus azulejos e painéis.
Bulcão estava internado havia quatro meses no hospital Sarah Kubitschek para tratamento do mal de Parkinson. Morreu em decorrência de uma parada respiratória às 9h25. Nos últimos dois anos, ele entrou e saiu do hospital várias vezes. Neste mês, passou por duas cirurgias. Esteve lúcido durante todo esse período.
"Artista eu era. Pioneiro eu fiz-me. Devo a Brasília esse sofrido privilégio. Realmente um privilégio: ser um pioneiro. Dureza que gera espírito. Um prêmio moral", disse certa vez o artista, que vai ser enterrado no cemitério Campo da Esperança justamente na ala dos pioneiros da cidade.
Um de seus grandes amigos, admiradores e colegas de trabalho, o arquiteto Oscar Niemeyer disse ontem estar "muito triste" com a morte de Bulcão. "É uma pena, era um amigo muito bom e uma pessoa correta", afirmou Niemeyer à Folha.
Sobre a obra do artista, o arquiteto, que o convidou para trabalhar em vários de seus projetos em Brasília, disse que ele conseguiu intervir na arquitetura de maneira inovadora -aliás, a fusão de artes plásticas com arquitetura pautou boa parte das construções modernistas no Brasil. "Ele fez uma relação da arquitetura com as artes plásticas, mostrando que poderia acontecer de forma inteligente."

Bulcão e Brasília
Cláudia Pereira, amiga e integrante do conselho curador da Fundação Athos Bulcão, disse que "Brasília e Athos são um a cara do outro. Acima do concreto e das grandes formas de Oscar [Niemeyer], ele trouxe, cor, luz e movimento".
Painéis, mosaicos e azulejos do artista podem ser vistos nos principais prédios da capital federal, como Catedral, Congresso Nacional, Itamaraty, Centro Cultural Banco do Brasil e também na Igrejinha de Nossa Senhora de Fátima, situada na região das quadras tidas como modelo de Brasília -308, 307, 108 e 107 sul.
Mas os trabalhos de Bulcão não estão restritos a monumentos da cidade. Muitos prédios residenciais construídos no início da cidade tinham os famosos azulejos de Bulcão. As figuras conhecidas desenhadas por ele foram utilizadas até em estampas de roupas de grifes brasileiras e canecas.
Fora do Brasil, seus trabalhos podem ser vistos pelo menos em Cabo Verde, França, Argélia, Itália e Argentina.

Portinari e Da Vinci
Bulcão foi amigo de alguns dos mais importantes artistas modernos, como Burle Marx -que projetou jardins de Brasília-, Jorge Amado, Vinícius de Moraes, Ceschiatti e Manuel Bandeira. Na década de 40, ele trabalhou como assistente do artista Cândido Portinari no painel de São Francisco de Assis da igreja da Pampulha, em Belo Horizonte.
Athos Bulcão falava de sua obra como uma mistura de talento e muito trabalho. "Arte é "cosa mentale'", dizia, citando Leonardo Da Vinci.
O artista não era casado e não teve filhos. Nasceu no Rio de Janeiro em 2 de junho de 1918 e chegou a Brasília em 18 de agosto de 1958, depois de uma temporada de nove anos em Paris.
O enterro está previsto para a manhã de hoje. Antes, o corpo do artista deve percorrer em cortejo a W3, uma das principais avenidas de Brasília.


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