São Paulo, sexta-feira, 02 de abril de 2010

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CINEMA

Crítica/ "Pecado da Carne"

Estreia do israelense Haim Tabakman levanta bandeira da liberdade sexual

ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"Pecado da Carne", o título em português deste primeiro longa do israelense Haim Tabakman, pode soar como piada quando se constata que Aaron (Zohar Shtrauss), o personagem principal, é açougueiro.
"Eyes Wide Open" (olhos bem abertos), o título em inglês, parece ser mais adequado, pois o açougue kosher de Aaron fica no bairro ultraortodoxo de Jerusalém, em que a pequena comunidade haredim vive fechada em si mesma e cada um vigia se o próximo respeita as draconianas leis do Talmude.
Em relação aos títulos, ambos acabam se revelando justos.
O filme é um arrazoado pela liberdade sexual, tema que deixa de ser comum ao ser abordado neste microcosmo específico, um universo paralelo em que tudo gira em torno da religião e a pureza da carne e do corpo está na base da vida da comunidade. Respeitado por todos, Aaron é pai de quatro filhos e estuda com afinco os textos sagrados.
Um dia, surge repentinamente o jovem Ezri (Ran Danker), um estudante misterioso e sem recursos, também ultraortodoxo, ao qual Aaron oferece emprego de ajudante no açougue.
Apesar da resistência inicial, Aaron sucumbe ao assédio de Ezri e os dois vivem uma paixão às escondidas. A homossexualidade não chega a ser proibida pelos ultraortodoxos: ela simplesmente não existe para eles, que nem sequer a nomeiam.
Tabakman filma essa história com sobriedade, sem sentimentalismo: os diálogos são escassos, os momentos de silêncio prevalecem, abrindo brechas aos subentendidos. Rivka (Ravit Rozen), a mulher de Aaron, capta tudo no ar: é sempre digna e não julga o marido.
Os planos longos, com poucos movimentos de câmera, reiteram o quão asfixiante é a vida dos transgressores. A atmosfera opressiva acaba atingindo o espectador. O trabalho dos atores, sobretudo Shtrauss, tem muito a ver com isso.
Tabakman trabalha muito bem as noções de público e privado, de puro e impuro. Os amantes só existem enquanto tais em lugares isolados, como o lago situado fora da cidade, para onde vão fazer banhos rituais de purificação, e o espaço da câmara fria do açougue, onde são estocadas as carnes kosher, ou seja, puras, sancionadas pela lei judaica.
Como se vê, o puro e o impuro coexistem de modo contraditório, em permanente tensão; religião e desejo se misturam tanto quanto água e azeite.


PECADO DA CARNE

Diretor: Haim Tabakman
Produção: Israel, Alemanha e França, 2009
Com: Zohar Shtrauss e Ran Danker
Onde: Espaço Unibanco Augusta 2, Frei Caneca Unibanco Arteplex 6 e circuito
Classificação: 14 anos
Avaliação: bom




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