São Paulo, quinta, 2 de abril de 1998

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"Na Suécia, não há equilíbrio nenhum"

da Redação

"Aos olhos do mundo, na Suécia, tudo parece estar sempre sob controle, em equilíbrio. Só que não há equilíbrio nenhum." É assim que o professor de jornalismo e documentarista Kjell-Ake Olsson, 57, dá um chute na aparente harmonia da sociedade sueca, durante visita a São Paulo para a exibição de "Botas Assassinas".
Calçado com botas pretas de cano alto, "mas sem ponta de aço", como fez questão de frisar, Olsson também aproveita a passagem pelo Brasil para tentar captar imagens e depoimentos sobre o ressurgimento da tuberculose.
"Talvez faça algo aqui, se encontrar pessoas." No roteiro de Olsson para o filme, ainda estão Índia, Nepal e África do Sul. O material será utilizado na sequência de "Hold Your Breath" (Prenda Sua Respiração), documentário sobre a doença no mundo que preparou para a TV escandinava em 96.
Após o registro da enfermidade física, o diretor partiu para o retrato da patologia social. Olsson iniciou a produção de "Botas Assassinas" após ver uma propaganda desses sapatos em uma revista para adolescentes, em que "elas eram intituladas "killer boots' (botas assassinas), assim mesmo. E a juventude sueca sabe inglês, então elas sabem exatamente a idéia que está sendo exibida ali, para vender, o que é chocante. Eu tinha de mostrar essas coisas".
O resultado veio depois de dois anos de pesquisa e US$ 40 mil. "Precisava enfocar a coisa de perto. Não quis falar com a polícia, para eles dizerem: "Não há nada disso'. A Suécia tem oito milhões de habitantes, dos quais cerca de um milhão são estrangeiros que vivem em grandes cidades, onde os ataques de jovens racistas são mais frequentes", afirma Olsson.
O documentário, concluído em 97, foi apresentado em escolas locais e teve sua exibição proibida no norte da Suécia, por ter sido considerado estimulante à violência.
Ao registrar a juventude em cidades suecas, como Estocolmo e Uppasala, e o processo de fabricação de coturnos em Northamptonshire, no interior da Inglaterra (região notória pela indústria de calçados), o filme também foi visto como um libelo contra a confecção de botas com pontas de aço.
"Uma vez me perguntaram se eu quis proibir as botas com esse documentário. Poderia dizer sim, e tudo ficaria fácil de ser entendido. Mas elas são apenas um detalhe. São uma metáfora para um conjunto maior de fatores."
Auto-intitulado "uma colagem de vozes, peles e sapatos", o filme chega a enumerar esses possíveis "fatores". A lista engloba dos pais dos adolescentes ao Ministério do Trabalho, das "forças de mercado" a Deus.
Para saber sobre quem o diretor joga a culpa, basta "prestar atenção na ordem em que os culpados aparecem", Olsson dá a dica, rindo, "mas essa conclusão deve vir das reflexões do espectador". (DENISE MOTA)

Filme: Botas Assassinas Produção: Suécia, 1997, 19 min. Direção: Kjell-Ake Olsson Quando: hoje, às 15h e às 19h, no Cinesesc



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