São Paulo, quinta, 2 de julho de 1998

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Júpiter Maçã - 1968 em 1998


Compondo como se vivesse no auge da era psicodélica, músico gaúcho de 30 anos estréia solo e elege os velhos sexo, drogas e rock'n'roll como temas prediletos


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

Embora a clássica tríade sexo-drogas-rock'n'roll perca adeptos a cada dia na era do tecno, ainda há sujeitos "regressivos" capazes de tomá-la como mote em 98. No Brasil, há Júpiter Maçã, um gaúcho que parece viver em 68 -ano em que nasceu-, em pleno desbunde psicodélico.
"A Sétima Efervescência", seu primeiro CD, lançado em Porto Alegre há ano e meio, em esquema independente, só agora alcança o resto do Brasil, pelos braços de uma grande gravadora.
Um detalhe pode confundir quem pense em rotular Júpiter Maçã (na verdade, Flávio Basso, rebatizado por razões espaciais -Júpiter- e por amor aos Beatles -a Maçã, inspirada na Apple, gravadora da banda inglesa) como roqueiro "retrô". Seu texto explicita temática contemporânea que os psicodélicos mantiveram apenas no terreno da metáfora.
A retórica existencialista é, ainda, a do cara apaixonado, mas já não há espaço para machismos roqueiros. Trecho de "As Outras Que Me Querem": "Eu creio que você às vezes queira dar pra outros carinhas no pedaço/ não, não acho tão legal/ no entanto é questão da gente sentar e conversar". "Quero crescer, não sou nenhum espertalhão. Sentimentos de posse atrapalham as pessoas. Minha música não é adolescente", declara.
O roqueiro Flávio Basso não é um novato. Liderou, nos anos 80, as bandas TNT e Cascavelettes ("grupos de rock, certamente").
A partir de 93, passou por fase "folk", em que adorava Bob Dylan e Byrds, antes de chegar ao ente JM. Para este, rejeita o rótulo de "roqueiro". "A música não é rock, as letras também não. É uma expressão artística, uma fotografia de um período", despista.
"Prefiro chamar de música psicodélica brasileira. E ouso definir psicodelia da minha maneira, como a saturação das coisas -da imagem, da letra, da música."
E o tecno? " "Pictures and Paintings' podia ser uma letra tecno, se combinássemos que sou um cara tecno. Clubbers e ravers gostam muito do meu disco. Prefiro a melodia, mas gosto do tecno. Acho pulsante, forte, significativo."
E o rock? "Me identifico com Beck, é muito, muito legal. Pop inglês é interessante, Verve tem a ver. Não posso negar que gosto de algumas canções do Oasis e adoro o cabelo de Liam Gallagher." E dos antigos, Beatles, Kinks, Who, Pink Floyd com Syd Barrett.
E os brasileiros? "Chico Science tem parentesco, embora seja outra coisa, na saturação das formas. Gosto da música brasileira no retorno. Escrevo minha bossa sob influência de Troggs, na volta acham que parece Mutantes. Ouço Manfred Mann, Zombies, na volta parece Sergio Mendes. Tom Zé é genial. Gosto da tropicália."
Definindo psicodelia como saturação, relativiza a questão drogas. "LSD pode levar à saturação, mas não fiz um CD à base de LSD. Eventualmente tenho trips, mas não é obsessivo, nem apologia."
Mais postura "rocker"? Ele anda evitando a Rede Globo -Regina Casé tentou mais de uma vez atraí-lo a seu programa, sem sucesso. "Seria como não levar o violão certo para tocar a música certa. A Globo não vem ao caso."
Se é que há nicho para um novo rock star brasileiro, JM já ocupa o primeiro lugar da fila. E já está preparando seu próximo disco.



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