ADRIANA FERREIRA SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

Quem freqüentou a última -e única- edição paulistana do festival espanhol Sónar, em 2004, deve se lembrar de uma atmosfera "mágica" que tomou um dos auditórios do Instituto Tomie Ohtake no último dia do evento. O lugar estava lotado, e as pessoas vibravam, todas no mesmo ritmo, acompanhando os efeitos e as nuances sonoras que se alternavam entre momentos ora jazzísticos, ora de uma leveza flutuante.
Conduzindo essas sensações estava o franzino inglês Kieran Hebden, que, sob o codinome Four Tet, fez uma performance "tocando" um laptop. A boa notícia é que acaba de chegar ao Brasil seu novo disco, "Everything Ecstatic".
Em seu quarto CD, o ex-guitarrista da banda de pós-rock Fridge aprofunda as experimentações eletrônicas e, apesar disso, muitas vezes soa mais orgânico, acentuando as influências de jazz, também presente nos anteriores.
"Uma das intenções desse disco era refletir a euforia e a excitação de quando se está ouvindo free jazz", disse Hebden à Folha por telefone. "Gosto de músicos como John Coltrane e quis trazer essa atmosfera para meu álbum."
Se a bateria desordenada do free jazz marca faixas como "Sun Drums and Soil", é graças às técnicas de "colagens" sonoras do hip hop que Hebden constrói sua música. O inglês aprendeu isso com alguns dos mais criativos produtores do estilo atualmente -entre eles, os americanos Madlib, DJ Shadow e Prefuse 73 -não por acaso, todos têm o jazz como uma de suas referências.
"Basicamente, meu jeito de fazer música vem do hip hop. Especialmente de trabalhos de Madlib e Prefuse 73. Fazemos as coisas de maneira similar, temos idéias parecidas", afirma Hebden. "Eles realmente me impactaram."
Mas não é só com a produção "cabeça" do hip hop e do jazz que Hebden se identifica. Ele também tem seu lado mais pop.

Festinha
"Gosto da experiência de discotecar em clubes, quando toco electro e tecno", diz o inglês. Acho importante um produtor saber fazer música dançante. É bom para refrescar a mente ou, de outra maneira, você só faz canções para as pessoas ouvirem na cama."
Nessa linha, destaca-se a ensolarada "Smile Around the Face", uma música para festinha de fim de tarde que lembra faixas do disco "Screamadelica", da banda britânica Primal Scream.
Além de todas essas vertentes, Hebden também flerta com o pós-rock -de seu passado no Fridge-, principalmente quando toca vibrafone, como em "High Fives".
"Dificilmente toco quando produzo. Estou mais interessado em encontrar samples em determinados discos, filmes, para editar novas músicas", fala ele. "Realmente gosto de usar o computador como um grande instrumento."
A paixão de Hedben pelas máquinas começou quando ele ainda era integrante do Fridge, no colégio. Nessa época, trocou a guitarra pelo computador.
"O computador me permitiu fazer coisas completamente diferentes do que tinha ouvido antes", lembra. "Era legal tocar guitarra, mas é muito mais difícil fazer algo soar diverso com ela", acredita.
Foi assim que, além do projeto eletrônico Four Tet, nasceram colaborações, como a parceria com o baterista Steve Reed, o disco "Spirit Walk", que acaba de sair na Europa, e uma coletânea de remixes que Hebden está fazendo para o selo alemão DJ Kicks.
Ambos não têm lançamento previsto no Brasil, mas Hebden quer fazer um show aqui. "Quero ir a São Paulo e talvez ao Rio. Aí é Carnaval e aqui, da minha janela, está tudo cinza..."