São Paulo, sábado, 03 de setembro de 2011 |
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RÉPLICA Crítica do livro passa ao largo do método que articula a narrativa "Liberdade Versus Igualdade - O Mundo em Desordem" é uma história das ideias políticas no século passado FIZEMOS UMA QUE NÃO SE MOVE SOB A ÉGIDE DE "LEIS" EVOLUTIVAS EXTRAÍDAS DE UM SUPOSTO DETERMINISMO ECONÔMICO DEMÉTRIO MAGNOLI ESPECIAL PARA A FOLHA Oscar Pilagallo, jornalista, escreveu um livro sobre Roberto Carlos. Nesta Ilustrada (no dia 27/8), produziu uma crítica de "Liberdade Versus Igualdade - O Mundo em Desordem, 1914-1945" (Record), que escrevi em coautoria com Elaine Barbosa. Nosso livro é uma história das ideias políticas no século 20. O resenhista ficou tão incomodado por identificarmos na tensão entre liberdade e igualdade uma chave para a tradução dessa história que resolveu enterrar o passado recente sob uma lápide de mármore. "A vocação polêmica da obra", decreta Pilagallo, "é limitada pelo fato de os alvos principais -o nazismo e o comunismo soviético- serem cartas fora do baralho ideológico atual". Hoje, stalinistas e nazistas ocupam franjas marginais do espectro político, mas a sua crença compartilhada permanece em cena: a ideia da salvação pelo Estado, que promoveria a igualdade social (contra o capital) ou a igualdade dos nacionais (contra os estrangeiros). Oscar Pilagallo não menciona, mas os economistas liberais neoclássicos estão também entre os "alvos principais" da obra. Seria a ideia da salvação pelo mercado uma "carta fora do baralho" na hora em que os epígonos degenerados de Mises e Hayek, reunidos no Tea Party, empurram a confiança no dólar até a beira do precipício? Existe uma história canônica do século 20 inscrita no senso comum com a força das coisas da natureza. Ela foi escrita por Eric Hobsbawm e se chama "A Era dos Extremos". Desconfio que o incômodo de Pilagallo deriva da divergência fundamental entre a nossa narrativa e a história canônica, de inspiração stalinista, segundo a qual a democracia parlamentar no Ocidente foi salva pelo Estado totalitário soviético. Fizemos uma história anti-Hobsbawm, isto é, uma história que não se move sob a égide de "leis" evolutivas extraídas de um suposto determinismo econômico. Eis a fonte do incômodo. Pilagallo passa ao largo do método que articula a narrativa. Prefere me rotular como alguém "identificado com posições de direita" -provavelmente porque critico (em textos que nada tem a ver com este livro) as políticas que separam jovens estudantes de escolas públicas em "comunidades raciais" ou os generosos subsídios do BNDES a empresários bem conectados. É uma tentativa rudimentar de me converter em "carta fora do baralho" -e, por essa via, proteger a sacrossanta historiografia que ainda hoje resiste à queda do Muro de Berlim. Contudo, "debaixo dos caracóis dos seus cabelos", há "uma história pra contar, de um mundo tão distante". DEMÉTRIO MAGNOLI, sociólogo, integra o Grupo de Análises da Conjuntura Internacional da USP. Texto Anterior: Crítica romance: Livro de Shriver ganha maldade e vísceras após começo tedioso Próximo Texto: Crítica contos/novela: Contos de Rubem Fonseca assustam pela banalidade Índice | Comunicar Erros |
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