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CRÍTICA
Italiano concebe história como dialética da sedução
CRÍTICO DA FOLHA
Na época, Carl Gustav Jung
era ainda um discípulo que
projetava em Freud a imagem do
pai. Imagem que o mestre cultivava: como lembra Jung em "Memórias, Sonhos, Reflexões",
Freud se apegava à sua "autoridade de pai" e tanto zelava por ela
que começara a perdê-la. Nessa
altura, Sabina Spielrein -personagem que Jung apagou de suas
memórias- entrou na história.
Spielrein era um nome esquecido até a publicação, em 1974, da
correspondência entre Freud e
Jung. Três anos depois, parte dos
diários de Spielrein e as cartas que
trocou com os dois papas da psicanálise foram achadas em Genebra: para os historiadores, tinha
sido dada a largada.
No filme de Roberto Faenza,
"Jornada da Alma", os que chegam primeiro são o historiador
escocês Fraser (Craig Ferguson) e
a professora francesa Marie (Caroline Ducey). Por motivos diversos, os dois investigam, em Moscou, que fim levara a misteriosa e
irrequieta Spielrein. A história de
sua relação com Jung é contada
paralelamente, o que não chega a
ser uma solução narrativa inteiramente banal. Faenza sobrepõe assim dois processos de investigação no passado, o dos historiadores e o do psicanalista.
Jung, a julgar por suas "Memórias", tinha dom para desvendar
os segredos mais inconfessáveis
de suas pacientes. Ao método
freudiano, somava uma intuição
toda particular. Spielrein, uma jovem russa, bela, brilhante e "histérica", foi uma de suas primeiras
pacientes, um de seus primeiros
sucessos, antes de se tornar um de
seus maiores segredos.
Jung concebia a relação com
suas pacientes como uma confrontação dialética de duas realidades psíquicas. Faenza concebe
a relação de Jung com Sabina como uma dialética da sedução.
A síntese de tal dialética seria
Siegfried, o filho que Sabina queria ter com Jung e que, segundo
ela, reuniria as qualidades da descendência judaica da mãe com o
vigor teutônico (ariano) do pai.
Mas foi Emma, a mulher de Jung,
quem teve, a essa altura, seu terceiro filho, o que teria precipitado
o rompimento e a crise dos amantes. Momento em que Freud entra
na história. Sua presença em "Jornada da Alma" é meramente epistolar, o que reforça muito bem a
função de autoridade paterna que
desempenhou no caso.
"Jornada da Alma" não é um
grande filme. A mão do diretor
Faenza volta e meia se faz pesada.
A produção volta e meia fraqueja,
ultrapassando os seus limites na
reconstituição da Rússia pós-revolucionária em que foi parar
Spielrein. Mas o filme é desses que
tomam partido de todas as suas
personagens e que, de tão enamorados por estas, nos seduzem.
(TIAGO MATA MACHADO)
Jornada da Alma
Prendimi l'Anima
Direção: Roberto Faenza
Produção: Itália/França/Inglaterra, 2002
Com: Iain Glen, Emilia Fox
Quando: a partir de hoje no Cineclube
DirecTV, Frei Caneca Unibanco Arteplex,
HSBC Belas Artes e Kinoplex Itaim
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