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CINEMA
Para cineastas, filmes políticos não deixarão de ser produzidos nos EUA por conta da reeleição de George W. Bush
Ativismo político continuará nas telas
NANCY RAMSEY
DO "NEW YORK TIMES"
Nos meses que precederam a
eleição de novembro, parecia que
a cada duas semanas surgia um
novo documentário cujo objetivo
era derrotar George W. Bush.
Os cinemas exibiram "Fahrenheit 11 de Setembro", "Bush's
Brain", "Going Upriver: The Long
War of John Kerry", e "Brothers
in Arms: The Story of the Crew of
Patrol Craft Fast 94". A MoveOn
exibiu "Outfoxed: Rupert Murdoch's War on Journalism", e
"Uncovered: The War in Iraq".
Um site aberto em setembro,
www.filmstoseebeforeyouvote.org [filmes para assistir antes de
votar], recebeu 13 mil visitas em
três semanas.
Agora, com a eleição encerrada
-e com resultados que George
Butler, diretor de "Going Upriver", comparou a "uma freada
brusca diante de uma parede de
tijolos"-, surge a questão sobre o
que o futuro reserva a esses cineastas. Entrevistados sobre seus
novos projetos, muitos deles deixaram claro que não encaravam a
recente mistura de cinema e ativismo político como fenômeno limitado à campanha presidencial.
"Os documentários políticos
não vão parar de repente porque
George Bush foi reeleito", disse
Erroll Morris, de "Sob a Névoa da
Guerra", documentário premiado com o Oscar, que analisa as fatídicas decisões que conduziram
os Estados Unidos ao Vietnã. Durante a campanha eleitoral, Morris filmou comerciais para a MoveOn, mostrando pessoas que votaram em Bush em 2000, mas planejavam votar em Kerry em 2004.
"Se as pessoas se motivaram a
fazer filmes devido à sua preocupação com a política de um dado
governo", afirma ele, "seria difícil
dizer que essas preocupações desapareceram em 2 de novembro".
Joseph Measley, de "Bush's
Brain", -sua primeira incursão
no mundo dos documentários
depois de 25 anos como diretor de
câmera- disse que "George
Bush continuará a fornecer muito
material". Robert Greenwald, que
dirigiu "Outfoxed" e "Uncovered", disse que se sente encorajado pelos milhares de e-mails que
recebeu em apoio aos seus filmes.
Já Michael Moore está preparando uma seqüência para "Fahrenheit 11 de Setembro", documentando o segundo mandato de
Bush. Perguntado sobre o projeto, Moore falou sobre o documentário que está dirigindo no momento, sobre os planos de saúde e
as companhias farmacêuticas, cujo título provisório é "Sicko" e que
o novo filme "deve chegar aos cinemas dentro de um ano e meio".
"Sicko" já causou certa preocupação entre as companhias farmacêuticas. Um boletim de notícias online no setor de pesquisa e
desenvolvimento da Pfizer publicou um artigo, descrito como "semi-humorístico" por Stephen Lederer, porta-voz da divisão de
pesquisa e desenvolvimento da
empresa, advertindo os funcionários de que se vissem um sujeito
desalinhado usando um boné de
beisebol, decerto saberiam de
quem se trata.
Filmes que pareciam tratar especificamente da eleição de novembro também estão encontrando ressonância agora. O Sundance Channel exibirá de novo
"With God on Our Side: George
W. Bush and the Rise of the Religious Right in America", no dia
do presidente, 21 de fevereiro. O
filme foi encomendado pelo
Channel 4, no Reino Unido, e antes que o Sundance decidisse exibi-lo nos Estados Unidos, conta
David Van Taylor, um dos diretores do documentário, estavam
"negociando com outra rede, que
disse que se Kerry vencesse o filme não teria interesse depois da
votação". Uma preocupação a
menos. "Desde a eleição, tive contatos de parte da CNN, National
Public Radio, Air America, distribuidores de DVDs, escolas e bibliotecas", disse.
Fenômeno semelhante aconteceu com "Rated R: Republicans in
Hollywood", exibido pelo AMC
em setembro e agora programado
para uma segunda transmissão.
"Rated R", diz o diretor, Jesse
Moss, é "um vislumbre do movimento conservador que normalmente não vemos, excluído o
componente evangélico".
Ainda que uma minoria, alguns
cineastas produziram documentários conservadores durante a
campanha, como "Celsius 41.11:
The Temperature at Which the
Brain Begins to Die", escrito e
produzido por Lionel Chetwynd e
Ted Steinberg, e lançado em outubro. Um exemplo mais típico de
cineasta politizado é Moss, que
disse que sua posição política se
enquadra perfeitamente à da "comunidade dos documentaristas,
que é muito progressista". Dez
anos atrás, ele trabalhava como
redator de discursos para o Partido Democrata, e está considerando agora um filme sobre os ataques com antraz no final de 2001.
"Não conheço ninguém que tenha votado em George W. Bush",
disse Moss. "Creio que essa seja
uma grande área cega para os documentaristas".
"Por trás da agenda liberal está a
idéia de que eu estou certo e você
está errado. Meu medo era que
boa parte do material vindo da esquerda ou dos democratas só falasse aos já convencidos. Às vezes
penso em "Fahrenheit 11 de Setembro" como uma tentativa de
criar uma igreja laica. Você iria ao
cinema para participar do culto
coletivo contra Bush, aquele herege", argumenta Morris.
"Desde que você prove que o filme pode faturar, é possível dizer
qualquer coisa", afirma o cineasta
Alex Gibney. "Creio que se Rupert Murdoch acreditasse que é
possível ganhar dinheiro com um
canal fervorosamente esquerdista, ele o criaria". Gibney e Eugene
Jarecki produziram "The Trials of
Henry Kissinger", lançado em
2002. Gibney agora está concluindo um projeto sobre a Enron que
vai estrear no Sundance Film Festival do mês que vem. Jarecki
também vai exibir um documentário no Sundance, sobre o militarismo norte-americano. Ele e Gibney receberam sugestões de que
seria melhor lançar os filmes antes da eleição. Ambos resistiram,
dizem, em parte porque queriam
que seus filmes fossem vistos em
contexto histórico mais amplo
que o da eleição.
Morris concorda. "Gostaria de
ver mais jornalismo investigativo
que não seja partidário", disse.
"Com "Sob a Névoa...", queríamos
deixar claro que os erros horrendos do Vietnã não foram cometidos só pelos republicanos. Quem
começou foi Kennedy e Johnson.
Deveríamos estar cientes de que
os erros não foram cometidos
apenas por republicanos".
Tradução de Paulo Migliacci
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