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Ronaldo Fraga cria antidesfile
DA COLUNISTA DA FOLHA
"Do que o mundo menos precisa hoje é de mais uma coleção,
mais um desfile ou mais uma lista
de tendências de moda", escreveu
Ronaldo Fraga em seu material
para a imprensa, que bem faz as
vezes de manifesto. Por conta disso, sua coleção de inverno, batizada "Corpo Cru", ganhou roupagem de antidesfile.
Ao contrário do que se possa
pensar, a crítica à indústria de
moda -característica de seu trabalho- não vem amarga. Ao
contrário: primeiro porque Ronaldo continua trabalhando com
moda, fazendo moda, produzindo e vendendo. E bem. Segundo
porque o estilista está em paz e feliz, com a consagração de seu trabalho, depois da última São Paulo
Fashion Week, e com o nascimento de seu primeiro filho.
E o que tem isso a ver com moda? Pensando na vida, pensando
na moda, Fraga quis expor a crise
da indústria global do vestuário
de modo honesto -e cru. Trocou
modelos por bonecos, que desfilaram em roldanas metálicas, um
velho carrossel de cabides, movendo-se ao som de delicada música de carrossel e tangos.
"No seu vai e volta, (os cabides)
sugerem que a escolha da roupa
venha a ser um jogo bem divertido, por mais doído que seja", diz.
O público ficou completamente
hipnotizado, transformado em
criança de novo, olhando para o
alto, como se visse um acrobata
dando um salto triplo no trapézio.
Nos bonecos de madeira, grandes
formas, camisas, vestidos, calças,
ampliações das peças da coleção
em si, expondo os novos materiais do estilista -o algodão tecnológico, a estampa do falso couro tipo pele e a padronagem de
seios sobrepostos, quase surrealista; a estampa de carne crua.
Tudo brasileiro, claro, tão brasileiro que, a certa altura, a engrenagem emperrou e entrou em
ação o plano B, que já estava preparado pelo estilista. "Eu sabia
que poderia não funcionar, mas
queria correr esse risco", disse o
estilista depois do desfile. Vestidas com camisetas da coleção, as
camareiras vieram à passarela,
carregando os bonecos. E o público delirou, em especial quando
entrou até mesmo a passadeira do
estilista, dona Irene, uma senhora
humilde que, carregando dois sapatos, foi transformada ali em
modelo de última hora. Um desfile nada convencional.
Ronaldo Fraga prossegue em
sua tarefa de fazer o Brasil refletir
sobre si mesmo por meio da roupa -coisa que só costuma acontecer por aqui no Carnaval...
(EP)
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